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21/06/2011

Nardelli no Decora Líder 2011

Nosso amigo Nardelli, artista plástico carioca radicado em Vila Velha, está presente na mostra Decora Líder 2011, cujos ambientes podem ser vistos aqui. Maiores informações sobre Nardelli podem ser obtidas em seu site.

24/01/2011

Mestre: Hod O'Brien

Cabuloso! Foi assim que Lester reagiu à nossa visita à mais renomada academia de Vila Velha. Após seus trinta anos de fumo, vinte de vodka e dez de vinho, consegui convencer Lester a participar de uma aula de aerobahia, a modalidade mais indicada para retirar-lhe a volumosa pança que a natureza, em sua generosidade, tem feito brotar em torno de seu umbigo. É preciso ter fé meu amigo, dizia eu a Lester enquanto caminhávamos pelas calçadas esburacadas da Praia de Itapoã, bairro onde também fica localizada a loja Casa Bonita. Ao chegarmos, vimos estranhos acadêmicos observando-se a si mesmos nos inumeráveis espelhos do local. Dercileydi, nossa professora trans de aerobahia, recebeu-nos com aqueles sorrisinhos e gritinhos que Lester tanto desaprova. Dada a largada com voz firme e grossa, os alunos iniciaram uma vigorosa e complexa coreografia de dar inveja a Fernando Bicudo. Durante alguns minutos, Lester encontrou imensa dificuldade em balbuciar alguns movimentos, limitando-se a observar os vertiginosos passos desferidos pelos demais alunos, incentivados pelo animado eletroaxé. Ajeitando seu curioso colante vermelho de luta greco-romana, Lester decide que isso não ficaria assim: embora um pouco desordenado, o bravo guerreiro lança as pernas em arriscados movimentos centrífugos, ao mesmo tempo em que gira os braços em movimentos centrípetos, causando uma certa perplexidade na turma e atraindo a atenção de toda a academia. Dercileydi, que já foi à Bahia, aprova a iniciativa de Lester, adotando seus passos originais e aumentando a velocidade com que eram executados. Embora não conseguisse manter o sorriso no rosto como os demais alunos e observadores, Lester também acelera os passos, dessa vez girando a cabeça de leste para oeste, movimentando o quadril numa trajetória elíptica e levantando os pés até as orelhas, tudo alternadamente, para dar mais swing. E os 50 minutos de aerobahia passaram assim, num piscar de olhos. Aclamado por toda a academia, Lester rejeitou o convite para lecionar seu estilo revolucionário e, após receber abraços e beijos em troca de autógrafos, partiu dali para nunca mais voltar.

Mancando muito, Lester e eu dirigimo-nos à tal Casa Bonita,  que eu ainda não conhecia, embora sabedor de que ali podia-se ouvir um bom jazz e apreciar um bom vinho a preços sinceros. Encontramos Nardelli, o pintor siciliano, sentado sob um acolhedor toldo laranja. Degustava um Yacochuya 2000, malbec argentino produzido num dos vinhedos mais remotos do mundo que, segundo Christine Austin, autora do diminuto 500 Vinhos Tintos, publicado pela Marco Zero, fornece um vinho intenso e saboroso, com traços frutados de morango e amora preta, notas de licor e especiarias, tudo isso numa composição tânica harmoniosa. Nardelli, oferecendo-nos duas taças, observou que a safra 2000 estava esgotada no site da Grand Cru, mas algumas garrafas ainda sobreviviam climatizadas na Casa Bonita. Perguntei então quem era o pianista e John Lester respondeu imediatamente: Hod O'Brien! Estive nesse dia abençoado, 7 de julho de 2004, no Blues Alley, quando Hod lá se apresentava! Visivelmente emocionado, Lester comentou que o Blues Alley  é o clube  mais antigo de jazz em funcionamento. Fundado em 1965, já recebeu ícones do jazz como Dizzy Gillespie, Sarah Vaughan, Nancy Wilson, Grover Washington Jr., Ramsey Lewis, Charlie Byrd e Maynard Ferguson, entre outros.  Fica localizado em Washington, DC, no número 1073 da Avenida Winsconsin, em Georgetown, o coração histórico da cidade, num edifício de tijolos construído no século XVIII.

Nardelli, que nunca foi à Bahia, complementou: Hod é mais um desses mestres esquecidos do estilo denominado New York jazz piano. Nascido no dia 19 de janeiro de 1936, em Chicago, chega a New York no final da década de 1950, integrando-se rapidamente aos clubes locais e atuando com diversos músicos importantes, entre eles Pepper Adams, Kenny Burrell, Oscar Pettiford e Stan Getz. Aos 21 anos, Hod grava com Art Farmer, Donald Byrd e Idrees Sulieman o álbum clássico Three Trumpets, também conhecido como Trumpets All Out, para a Prestige. Ainda aos 21, Hod é convidado por Red Rodney para substituir Bill Evans no quinteto de Oscar Pettiford. Mais tarde, trabalharia no quarteto de J. R. Monterose, ao lado de Wilbur Ware e Elvin Jones. Entre os anos de 1963 e 1973, Hod afasta-se do jazz, indo estudar Matemática na Columbia University. Nesse período, chega a estudar composição com Charles Wourinen mas acaba retornando ao jazz, abrindo seu próprio clube, o The St. James Infirmary, onde lidera sua própria banda e recebe artistas convidados como Chet Baker, Roswell Rudd, Lee Konitz, Zoot Sims, Charlie Rouse e muitos outros. Além disso, apresenta-se durante cinco anos no famoso Gregory’s com o guitarrista  Joe Puma.


Enquanto a maioria dos pianistas da sua geração mergulhou nas ondas do rock ou da latin music, Hod manteve-se fiel ao Bebop, transformando-se num dos intérpretes mais puros do estilo, como Barry Harris e  poucos outros. Na década de 1980, Hod passa a se apresentar com a cantora Stephanie Nakasian , com quem se casa e passa a viver em Charlottesville,Virginia. Sempre atuante, Hod tem se apresentado em diversos clubes e festivais ao redor do mundo. Em maio de 2007, foi selecionado para se apresentar no Fujitsu 100 Gold Fingers Tour, no Japão, ao lado dos pianistas  Kenny Barron, Cedar Walton, Junior Mance, Toshiko Akiyoshi, Cyrus Chestnut, Benny Green, Don Friedman, Joao Donato e Gerald Clayton. Embora possua uma técnica perfeita, Hod nunca permitiu que sua velocidade deformasse as baladas ou que sua criatividade sufocasse os temas. Entre os seus excelentes álbuns como sideman ou líder, selecionamos a faixa How About You , retirada do álbum  Live At Blues Alley - Second Set, em trio com Ray Drummond (b) e Kenny Washington (d). 
 

29/05/2009

Casa Dourada


Um dia ainda descobriremos como Lester prepara aquele suculento filé embrulhado em sal grosso com molho de brassica nigra. Alguns comentam que há pitadas discretíssimas de curry, enquanto outros apostam em leves retoques de noz moscada e mel. Bem, talvez nunca saibamos exatamente o que ocorre no interior daquela pequena cozinha da Casa Bonita, uma simpática loja capixaba de objetos de arte e decoração em Vila Velha. É no quintal ventilado do velho sobrado que acolhe o estabelecimento - onde muitas plantas oferecem um aroma saboroso à brisa marinha - que Lester serve vinhos devidamente climatizados aos seus convidados. Nessa noite tivemos o privilégio de saborear a estirpe completa da vinícola Quebrada de Macul, delicada boutique que injustamente não consta do bom livro 1001 Vinhos Para Beber Antes de Morrer, lançado no Brasil pela Editora Sextante. Éramos seis, aí incluídos o pintor siciliano Nardelli e sua mais nova assistente, Lizza. Lester pensou certo que quatro garrafas dariam conta da tímida demanda. Iniciamos com o vinho básico dessa fantástica vinícola, o Peñalolen 2005, produzido com 85% de cabernet e 15% de merlot, todas colhidas à mão em gamelas de 15kg e amadurecido por ao menos 12 meses em barris de carvalho francês, alguns novos, outros de segunda mão.

Embora com caráter respeitável e preço digno, não chegou a causar nenhuma demonstração de incontrolável entusiasmo, ainda mais que, na cozinha, Lester esmurrava sem piedade algumas indefesas batatas que seriam cozidas com azeite e alho. Lizza, passado o susto inicial, disse a Nardelli, em tom de queixa, nunca ter experimentado batata ao murro. Na verdade, com tanta excitação, criou-se certa expectativa com relação à próxima garrafa, um Alba de Domus 2003. Dessa vez há 95% de cabernet, contra 5% de merlot, amadurecidos por 19 meses em barris de carvalho francês novos (80%) e de segunda mão (20%). Os sedimentos calcáreos do Maipo, devidamente irrigados pela água generosa dos Andes, começaram a determinar a atenção dos convidados, com seu terroir próprio e, podemos dizer, bastante distante e diverso do terroir europeu, tido como modelo irretorquível. Nessa etapa nossos olhares já se dividiam alegremente entre as telas de Nardelli e as lágrimas que escorriam lentas e caudalosas das taças. Praticamente não houve intervalo entre uma rolha e outra: abrimos sôfregos um Stella Aurea 2000, com seus 95% de cabernet savignon, 3% de merlot e 2% de cabernet franc, todas provenientes de vinhedos antigos, com cerca de 30 anos. O amadurecimento ocorre por 18 meses em barris de carvalho francês de diferentes volumes, provenientes de florestas distintas e com torrefação variada. Enquanto Lester discorria animadamente sobre a invenção dos barris pelos gauleses, o aroma da carne contornava nossas narinas e amordaçava os taninos delicados desse vinho espetacular, de cor viva e personalidade intensa e prolongada que, supúnhamos, não poderia ser superado facilmente pela quarta garrafa. Lester aproxima-se então com um Domus Aurea 1999.

Todo o suspense se concentrou no interior das taças, onde o vermelho profundo e brilhante já anunciava que talvez os 19 meses em barril de carvalho francês novo (80%) não tenham sido suficientes para domar os sabores desse tinto que, acredito, não se acovardaria diante do mais potente borgonha que você possa desarrolhar. Com seus 95% de cabernet savignon, 4% de cabernet franc e 1% de merlot, o Domus Aurea fez com que apenas um quadro de Nardelli em homenagem a Pollock e Roland Kirk sobrevivessem aos suspiros dos convidados. Para os amigos fica a faixa Cabin In The Sky . São todos, a exceção do primeiro, vinhos que se beneficiam e aceitam guarda, variando entre 15 e 80 dólares pagos no Chile. Já os quadros de Nardelli - clique para ampliar - esses são um pouco mais caros. É casa, é domus, é cabin, cantarolava Lester enquanto lavava os pratos.