Merecida a homenagem que Salsa presta ao músico Benny Carter em sua recente resenha. Pelo fato de ter sido uma pessoa absolutamente normal durante toda sua longa carreira, Carter não costuma ser muito festejado nos meios jazzísticos. Sem a ira dionisíaca de um Charles Mingus, sem a excentricidade esquizofrênica de um Thelonious Monk e sem o sorriso perigoso de Duke Ellington, Carter dificilmente é citado como um dos maiores músicos do jazz. É grande o engano ou flagrante a injustiça colocá-lo no segundo escalão.
Carter é, entre outras coisas, o melhor arranjador da transição entre as décadas de 1920 e 1930, época em que Heisenberg proclamava o princípio da incerteza na Física. Tendo aprendido o ofício da orquestração por conta própria, chegou a rivalizar e até mesmo superar alguns mestres da época, como Don Redman. Fugindo ao modelo de sucesso fácil oferecido pelo swing, estilo que assolava o EUA nesses tempos, Carter construiu uma obra genial com humildade, independência e sensibilidade. Sua obra somente pode ser comparada à montanhesca criação da dupla Ellington & Strayhorn.
Ao contrário do trabalho de Ellington, essencialmente instrumental, as composições de Carter são extremamente ‘cantáveis’, característica que comprova sua veia de grande solista.
Benny Carter (1907-2003)
Ao contrário do trabalho de Ellington, essencialmente instrumental, as composições de Carter são extremamente ‘cantáveis’, característica que comprova sua veia de grande solista.
Além do trabalho como arranjador e compositor, Carter era um exímio instrumentista, capaz de cantar, tocar piano, trombone, trompete e os saxofones soprano, alto e tenor. Embora excelente trompetista, foi com o sax alto que Carter se destaca como um dos mais importantes improvisadores do jazz: suave, doce e tranqüilo, nem mesmo a velocidade assustadora imposta por Charlie Parker foi capaz de ofuscar a beleza de seus solos. Sua sonoridade única influenciou vários mestres do saxofone, entre eles Sonny Rollins. Carter era o tipo de pessoa que, assim como o inigualável Lester Young, apesar de negro, nunca teve vergonha ou malícia em negar a profunda influência recebida de Frank Trumbauer, um excepcional saxofonista branco renegado no jazz por sua cor. Para Carter a beleza da música estava acima do racismo irracional.
Carter provou com seu trabalho que nem toda música doce e agradável é necessariamente música de elevador ou de consultório dentário. Sua obra comprova que a música pode ser inteligente e complexa sem ser necessariamente chata e inaudível. Ele sabia, mais e melhor que todos nós, que o sucesso obedece cegamente ao princípio da incerteza, principalmente When Lights Are Low. Mas o mestre, é claro, não se importava com isso.
Benny Carter (1907-2003)
3 comentários:
grande e informado Lester
Grande músico e merecida resenha. Parabéns pelo blog.
Neste exato momento estou ouvindo o maravilhoso cd Further definitions (quase escrevi intentions - Freud explica?), com a orquestra de Benny Carter. Estão lá mr. Hawkins, Rouse, Jo Jones e mais um bando de gente boa. Obrigado, bom deus.
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