18/09/2010

The Blindfold Tests

E, falando em ingleses, diz a lenda que foi Leonard Feather quem inventou o Blindfold Test, expressão que poderia ser traduzida como teste às cegas ou teste com os olhos vendados. E não me venham questionar porque Leonard vendava seus convidados, questão que certamente jamais será esclarecida, exceto por sua carga dramática. O certo é que várias pessoas e músicos famosos foram desafiados a identificar quem estava tocando, sem receber nenhuma informação sobre o tema, o compositor, o arranjador e, obviamente, os executantes. Os blindfold tests foram elaborados por Leonard na década de 1940, quando escrevia para as revistas Metronome e Esquire, além de  serem apresentados semanalmente em seu programa de rádio, o Platterbrians. Surpreendentemente, eram raros os convidados que acertavam os nomes dos executantes: boa notícia para aqueles que possuem dificuldades em distinguir um saxofone de um trompete. Nessas ocasiões, sempre surgiam situações curiosas, como foi o caso do trompetista Roy Eldridge, que disse a Leonard ser capaz de identificar a cor do músico apenas ouvindo-o tocar. Bizarro também foi a venda colocada em Lennie Tristano, um dos maiores pianistas do jazz, absolutamente cego. As regras eram rígidas e iguais para todos.  Na verdade, a grande maioria dos convidados limitava-se a avaliar a execução, fornecendo-lhe notas de 1 a 4 estrelas, processo em que se podia verificar que muito do sucesso de um músico não estava associado única e exclusivamente ao seu valor musical, mas à moda, à preferência pessoal e ao marketing.

Este foi o caso da primeira convidada de Leonard, a pianista Mary Lou Williams (na foto de Zin Arthur, publicada na Metronome em 1946, com Leonard), instrumentista, compositora e arranjadora renomada que, na ocasião, confessou que não apreciava o estilo Dixieland e fez as seguintes observações sobre as execuções que lhe foram apresentadas:

01 - Benny Goodman. Blue Skies (Columbia), com Art Lund, vocal – Bom clarinetista; banda agradável; o cantor não possui voz adequada para o improviso – 2 estrelas.
02 - Johnny Guarnieri. Salute to Fats (Savoy). Guarnieri, piano; Lester Young, sax tenor; Billy Butterfield, trompete; Hank d’Amico, clarinete; Cozy Cole, bateria – O pianista lembra Fats; tem uma técnica maravilhosa, mas seu estilo parece uma imitação; o saxofonista é excelente, já o trompetista não é lá essas coisas. Gostei – 3 estrelas.
03 - Sir Charles Thompson. The Street Beat (Apollo). Thompson, piano; Buck Clayton, trompete; Charlie Parker, sax alto; Dexter Gordon, sax tenor; J. C. Heard, bateria - Bom sax alto, Charlie Parker é claro; bom trompetista; bom sax tenor; bom arranjo; boa seção rítmica; o pianista sola como Count Basie – 3 estrelas.
04 - Woody Herman Orquestra. Northwest Passage (Columbia). Ralph Burns, piano; Marge Hyams, vibrafone; Flip Phillips, sax tenor – É assim que eu gosto de ouvir uma banda tocando! Pianista muito bom; bom vibrafonista; saxofone tenor excelente. O arranjo não tem nada de extraordinário, mas é bom. Balanço maravilhoso – 4 estrelas.
05 - Art Hodes’ Jazzmen. Sugar Foot Stomp (Blue Note). Hodes, piano; Vic Dickenson, trombone; Maxie Kaminsky, trompete; Ed Hall, clarinete; Sid Weiss, contrabaixo; Danny Alvin, bateria – O trombonista é Vic Dickenson. O que ele está fazendo aqui? É uma pena ouvir bons músicos tocando Dixieland! O clarinetista é Ed Hall. O trompetista lembra Louis Armstrong há vinte anos atrás. Baterista e contrabaixista bons. Já ouvi pianistas de Dixieland melhores. Não gosto do tema – 2 estrelas.
06 - Barney Bigard. Blues Before Dawn (Black and White). Bigard, clarinete; Georgie Auld, sax alto; Joe Thomas, trompete - Esplêndida introdução. Trompetista maravilhoso, com bom gosto e idéias originais; bom saxofonista, lembra Johnny Hodges. O clarinetista parece ter saído da banda de Ellington – 3 estrelas.
07 - Jelly Roll Morton Red Hot Pepper (Victor). Morton, piano - Tem alguém tocando tuba aí? Eu não reconheço isso, mas deve ser alguma gravação da década de 1920. Os solos são até bons para a época, mas não há nenhum balanço; não sei como as pessoas conseguiam dançar ouvindo isso. Nenhuma estrela.
08 – Nat King Cole Trio. Body and Soul (Capitol). Cole, piano; Oscar Moore, guitarra; Johnny Miller, contrabaixo – Nat King Cole, ele é grande; está aí um tipo de música que todos deveriam ouvir. Bom gosto, com balanço. E a música conta uma história. Uma das melhores versões que já ouvi e, ainda que o pianista não seja o Nat, continuo achando tudo perfeito - 4 estrelas.
09 - James P. Johnson. Blueberry Rhyme (Signature). Piano Solo – Parece um piano mecânico, como um daqueles piano rolls. Não há liberdade e a composição parece ter sido escrita errada - 2 estrelas.
10 - Dizzy Gillespie Be-Bop (Manor). Gillespie, trompete; Don Byas, sax tenor; Shelly Manne, bateria – Bom arranjo, mas parece não haver sintonia entre os músicos. O trompetista parece Dizzy, bom. O saxofonista é Don Byas, ele pode tocar em qualquer estilo. O baterista lembra Max Roach. Gosto mais da idéia da gravação do que da execução – 3 estrelas.
11 - Boyd Raeburn Orquestra. Yerxa (Jewel). George Handy, arranjador; Hal McKusick, sax alto – Eles parecem desafinados. Talvez seja um arranjo experimental, mas parecem estar tocando errado. O som lembra um pouco a banda de Ellington. Bom saxofonista – 2 estrelas.
12 - Harry James Orquestra. When Your Lover Has Gone (Columbia). James, trompete; Corky Corcoran, sax tenor – Melhor gravação que já ouvi de Harry James em muitos anos. Solo com muito bom gosto. Banda e arranjos bons. O saxofonista também é grande – 4 estrelas
13 - Bunk Johnson Band. When the Saints Go Marching In (Victor). (Recorded 1945) – Não sei o que dizer. Não aprecio pessoas que tocam uma música feita há quarenta anos atrás. Deve ser apenas para ganhar dinheiro. E os solos nem mesmo são bons para este estilo. Musicalidade? Não ouvi nenhuma.

Para os amigos, apenas como aperitivo, deixo a seguinte faixa . O primeiro leitor (ou seria ouvinte?) que acertar quem é o saxofonista receberá gratuitamente o álbum completo, original e lacrado em seu endereço, sem qualquer custo de frete. Peço apenas que o teste seja realizado com os olhos vendados. Boa sorte!


19 comentários:

PREDADOR.- disse...

Mary Lou Williams estava completamente certa em seus 13 comentários do "blindfold test", sem tirar nem por uma vírgula. Aliás, seu gosto musical, baseando-se no blid.test, é bastante semelhante ao meu. Além de ser uma excelente pianista, entendia realmente de arranjos, músicos e música de jazz. Quanto ao seu teste, mr.Lester, de "acertar quem é o saxofonista", não estou ouvindo sax algum deixado na faixa e sim o trio de um pianista, provavelmente Russo, executando "'Round Midnight".

thiago disse...

sax medonho

jose reyes disse...

O saxofonista deve ser o Gasparzinho. Só ele poderia utilizar um saxofone fantasma.

Roberto Scardua disse...

Não ouvi sax nenhum Lester. E aí?

Ana Carla Nunes disse...

Maravilhoso Blog!

Adoro o Jazz, e gostaria de parabeniza-los pelo conteudo deste espaço virtual!!

Aproveito e convido-os para conhecerem meus blogs, e trocarmos figurinhas musicais tb:

www.brasildiversificado.blogspot.com
www.festasdabahia.com
www.quartetoemcyeafins.blogspot.com

Um abraço grande!

Ana Carla Nunes

Érico Cordeiro disse...

Também não ouvi saxofonista algum. Seria o Albert Ayler, numa performance muda?

Paula Nadler disse...

Lester, não estou ouvindo o sax...

Beijo.

Vagner Pitta disse...

Seria o Gaspar Zinho ou um saxofonista também com destreza em teclados?


Bem, sobre a Mary Lou Williams, sou suspeito: eu poria ela à frente da maioria dos grandes pianistas da história e, no quesito composição, julgaria seu talento tão grande quanto o de Duke Ellington -- sem considerar, lógico, que o trabalho de Duke é um dos mais extensivos, em todos os sentidos, da história do jazz e da música.


Sobre o gosto musical dela, impresso aí nesses comentários, nota-se como ela tinha um pensamento progressista e, ao mesmo tempo, uma paixão clara pela tradição sem ficar presa ao passado (nota-se que ela diz: "é lamentável ver grandes músicos tocando uma música de quarenta anos atrás; eu acho que eles fazem isso pra ganhar mais dinheiro"). Nota-se que gostava de uma música fluida, com balanço e prezava, sobretudo, pelo arranjo -- a mulher era um Duke Ellington de saias!!!


Se Mary Lou fosse viva e estivesse com seus 45 ou, que seja com seus 50 anos de idade, com certeza ela teria um gosto mais apurado e estaria pensando mais à frente que muitos jovens pseudo-musicistas: ela, de certo, não defenderia mais a dança, o swing, o blues e todos os velhos elementos que, para o jazz contemporâneo, já não são tão elementares, haja vista a quatidade de novos elementos que o jazz vem adquirindo após os anos 60 e os que vem adquirindo nas últimas décadas e agora com essa eclética geração 2000.


Mas, respeito e aprecio a idéia de que o swing, o balanço, o bebop, o funky e todos os elementos tradicionais nunca poderão ser esquecido: ele deve ser sempre apreciado -- pra isso, aliás, já há museus de jazz.

Abraços!

pituco disse...

master lester,

obrigadão pela visita lá no rancho virtual...e pela contribuição.

aproveito e convido os colegas pro desafio lá do meu blog...certamente, mais fácil do que esse daqui de master lester...passo a vez..primeiro, porque tenho fobia a vendas nos olhos...e, muito mais, por um trauma recém adquirido a premiações dessa natureza...rs

abraçsonoros

John Lester disse...

Prezado Mestre Pituco,

Não seria exagero confessar que nunca na história desse blog alguém já venceu o Desafio Jazzseen exceto o senhor.

Sabe-se lá com que artimanhas japonesas o senhor conseguiu desvendar nosso desafio mas o fato é que, único e isolado, somente você já acertou um de nossos desafios.

Portanto, obrigado pela participação e até nosso próximo desafio.

Grande abraço, JL.

Internauta Véia disse...

E o sax...?

Procurei o "Confesso que ouvi" na La Selva do Santos Dumont,e na Travessa só pro pessoal ir se acostumando com o título...eu sei que por enquanto está sendo distribuído sómente no Maranhão...

Internauta Véia disse...

Você é fogo, hem, Mr.Lester...!!!

Os pedriscos aumentaram sua verve...muito bom!.Talvez pela idade (muito) avançada, custei a perceber...

Takechi disse...

O saxofonista eu não sei, mas o pianista acho que é o Alan Broadbent.

Frederico Bravante disse...

Eu concordo com o amigo Takechi, apostaria todas as fichas no pianista Alan Broadbent.

figbatera disse...

Esse Lester é um sacana...(um gozador)!

augusto carlos disse...

Esses japoneses e suas maquininhas infernais...

Como eles conseguem identificar qualquer faixa, mesmo que sem nenhuma informação? Será algum programa? Se alguém souber como, me avise!

Sergio disse...

Pois é mr. John, recebi o chamado bem na época do desafio, mas ainda sem praca de áudio, nem animei a ler. Agora, ainda sem som, adorei essa história de blindfold. Adorei as analises de Marilu, mas mesmo com o áudio perfeito na placa, cá entre todos... Quem sou eu pra adivinhar quem ta tocando? Talvez só seja eu capaz de reconhecer que o Hermeto está tocando o porco, se houver uma hermética música em volta...

Então sabe o que faço? Divinha. Trato de baixar os raros álbuns elogiados por ms. Williams. Craro.

Anônimo disse...

Hi, very interesting post, greetings from Greece!

Anônimo disse...

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