Estranho-me. Ultimamente tenho me permitido experiências que, normalmente, eu teria evitado. Por exemplo, tenho ouvido discos de trios liderados por pianistas. Já disse em outro lugar (no blog do Acir, o contraovento) que antipatizo com essa formação. Inveja minha, talvez. O danado do piano é um instrumento completo (resiste mais tempo sem acompanhamento). Experimente tocar três temas de sax sem a cozinha: é um saco. Recentemente, foi-me enviado por um navegante que por aqui aportou, os cds da caixa The complete blue note recordings, de um pianista que, como os outros, eu não fazia questão de ouvir: Herbie Nichols. O nome de fusquinha de filmes infantis depõe contra o camarada, mas, devo admitir, ele tem um modo de tocar que não é nada infantil. Suas frases e harmonias são extremamente interessantes: percebe-se com facilidade que o rapaz tem um arcabouço de informação musical que escapa à média dos músicos. Seu patamar musical permite-lhe brincar com os limites do bom senso harmônico e estabelecer fórmulas nas quais a tensão torna-se um campo surpreendentemente produtivo, como fazem os grandes compositores eruditos do século XX e como também fez o bom e sempre jovem Monk (aliás, é possível perceber as mãos de Monk ao lado das de Nichols quando o disco está rodando). Não tem jeito: esse território maldito e limítrofe entre a sanidade e a loucura propicia uma música estranhamente suntuosa e envolvente. É isso: espero que, se um dia eu enlouquecer, eu possa tocar assim.
Faça um test-drive com Herbie e outros veículos em Jazzseen By Salsa (clique com o botão direito do mouse e, em seguida, clique em "abrir em uma nova janela").
9 comentários:
Muitos falam bem do Herbie, inclusive gente mais nova com releituras do espantoso pianista. Contudo, não me empolguei quando ouvi a caixa. Algo não entrava em minha orelha. Quanto à completude do piano, sou obrigado a discordar do mestre, aliás, Doutor Salsa: há certas tessituras e semitons inatingíveis ao piano e plenamente trabalháveis pelos sopros. Basta ouvir um bom saxofonista de jazz improvisando um blues. Decididamente, apenas aquelas teclas petras e brancas não levantam o mesmo vôo.
Pior de tudo foi que comprei esse álbum. Talvez de graça soasse melhor.
JL
Ouça de novo. Às vezes, o som só pega na segunda (eu só ouvi hoje, depois de algum tempo, por falta de assunto). Quanto ao sax, eu não compraria um disco solo (sem acompanhamento).
Acho que o que eu sinto pelo piano solo é a mesma coisa que vc sente pelo sax solo. Vou te levar, então, alguma coisa do braxton ... Sei lá, mas tenho tido boas surpresas com algumas coisas solo do moço. Fico devendo, ok ?
Vocês ficam assim nesse troca-troca por que ? Já não moram juntos ? Deixem de conversa e disponibilizem o som do Herbie Se-Meu-Piano-Falasse no Blog, ok ?
Prezado Cretino, a primeira faixa do próximo disco do gramophone sob minha responsa será do Herbie (vou deixar o atual rodar mais um pouco, seguindo a sugestão do Capitão dessa Nau de loucos, Sir John "fanqueiro" Lester).
Vinícius, eu também adoro Monk, mas sem um quarto instrumento além do piano, baixo e bateria, eu também acho que fica cansativo. Nesse sentido,Oscar Peterson é bastante esperto, ao usar um guitarrista em seus trios torna seus discos mais transitivos.
Confeso minha curiosidade sobre esse pianista com fama de excelente compositor(Lady Sings The Blues, com a Billie, eg), morto prematuramente. Aguardo difusão de algum material no Gramaphone.
Êpa Salsa, sem essa de grama...É Gramophone. Grama Zero.
Deixei uma faixa pra você, rogério, e pro vinícius, que também gosta de pianistas.
Se o saxofonista misterioso de seu álbum não for Coltrane eu me jogo lá da terceira ponte.
JL
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