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O fato de eu ter achado o show de Herbie Hancock em Vitória pavoroso (na verdade um dos piores shows de jazz a que já assisti) não significa que eu não admire ou que eu não goste de seu trabalho. Ao contrário, gosto muito de certas fases desse grande músico. E fiquei muito triste em verificar que o velho mestre optou quase exclusivamente pelo sintetizador em seu show no dia 28/10/06 simplesmente porque o som do piano acústico disponível no Teatro da UFES era nitidamente deplorável. O pianista de Roy Hargrove, que se apresentou na véspera, já denunciara a catastrófica situação do som do instrumento. Ele me fez lembrar daqueles coloridos pianos de brinquedo que todos nós já digitamos curiosos e fascinados um dia. Mas o que eu senti em relação a Herbie não foi somente um problema de escolha de arma. Para mim, o problema maior foi a escolha da munição: em seu eterno zigzag estilístico, passando pelo hard bop, pela fusion, pelo pop, pela música clássica européia, pelo post bop e pelo rap, Herbie chegou à maturidade com uma espécie de mosaico musical irreconhecível dentro do cérebro, um mosaico colorido demais, detalhado demais, influenciado demais, rico demais, complexo demais. Resultado: ninguém sabe que tipo de música o mestre tocou no TIM Festival. Jazz? Se jazz, de que estilo? Onde foi parar o swing? Onde está o blues? Onde está aquela coisa que faz do jazz, jazz ou que faz do chorinho, chorinho? É como você comer uma moqueca capixaba sem cheiro, sem cor, sem panela de barro. Acredito que nem o amante do jazz, nem o amante do rock e nem o amante do rap tenha gostado do show. Conforme eu já disse em resenha anterior, depois desse ir e vir, Hancock me lembrou, durante o show, uma espécie de Yanni misturado com Stockhausen. Nós, ouvintes atônitos, ficamos diante de Herbie como aquela criança assustada que fica diante de um pai desequilibrado que hora acaricia, conversa e ama, hora bate, castiga e tortura. Claro que nos sentimos perdidos e confusos. Entendo que a política do improviso deve estabelecer padrões mínimos de discurso, sem que com isso se perca a criatividade, o bom humor ou a alegria. Na década de 1960 Herbie traçou algumas linhas interessantes de discurso musical, atuando com originalidade sem perder a noção de salubridade artística. Mas talvez, ao que tudo indica, essa já não seja mais a dele. A seguir deixo à disposição dos argonautas alguns bons momentos do jovem Herbie, um camarada que já foi muito bom pai, mas que se transformou num vovô muito malvado. A faixa clássica, Cantaloupe Island, foi retirada do dvd One Night With Blue Note, gravada em 1985 com Freddie Hubbard (t), Joe Henderson (ts), Herbie (p), Ron Carter (b) e Tony Williams (d). Como sempre diz minha irmã: menos é mais.
O fato de eu ter achado o show de Herbie Hancock em Vitória pavoroso (na verdade um dos piores shows de jazz a que já assisti) não significa que eu não admire ou que eu não goste de seu trabalho. Ao contrário, gosto muito de certas fases desse grande músico. E fiquei muito triste em verificar que o velho mestre optou quase exclusivamente pelo sintetizador em seu show no dia 28/10/06 simplesmente porque o som do piano acústico disponível no Teatro da UFES era nitidamente deplorável. O pianista de Roy Hargrove, que se apresentou na véspera, já denunciara a catastrófica situação do som do instrumento. Ele me fez lembrar daqueles coloridos pianos de brinquedo que todos nós já digitamos curiosos e fascinados um dia. Mas o que eu senti em relação a Herbie não foi somente um problema de escolha de arma. Para mim, o problema maior foi a escolha da munição: em seu eterno zigzag estilístico, passando pelo hard bop, pela fusion, pelo pop, pela música clássica européia, pelo post bop e pelo rap, Herbie chegou à maturidade com uma espécie de mosaico musical irreconhecível dentro do cérebro, um mosaico colorido demais, detalhado demais, influenciado demais, rico demais, complexo demais. Resultado: ninguém sabe que tipo de música o mestre tocou no TIM Festival. Jazz? Se jazz, de que estilo? Onde foi parar o swing? Onde está o blues? Onde está aquela coisa que faz do jazz, jazz ou que faz do chorinho, chorinho? É como você comer uma moqueca capixaba sem cheiro, sem cor, sem panela de barro. Acredito que nem o amante do jazz, nem o amante do rock e nem o amante do rap tenha gostado do show. Conforme eu já disse em resenha anterior, depois desse ir e vir, Hancock me lembrou, durante o show, uma espécie de Yanni misturado com Stockhausen. Nós, ouvintes atônitos, ficamos diante de Herbie como aquela criança assustada que fica diante de um pai desequilibrado que hora acaricia, conversa e ama, hora bate, castiga e tortura. Claro que nos sentimos perdidos e confusos. Entendo que a política do improviso deve estabelecer padrões mínimos de discurso, sem que com isso se perca a criatividade, o bom humor ou a alegria. Na década de 1960 Herbie traçou algumas linhas interessantes de discurso musical, atuando com originalidade sem perder a noção de salubridade artística. Mas talvez, ao que tudo indica, essa já não seja mais a dele. A seguir deixo à disposição dos argonautas alguns bons momentos do jovem Herbie, um camarada que já foi muito bom pai, mas que se transformou num vovô muito malvado. A faixa clássica, Cantaloupe Island, foi retirada do dvd One Night With Blue Note, gravada em 1985 com Freddie Hubbard (t), Joe Henderson (ts), Herbie (p), Ron Carter (b) e Tony Williams (d). Como sempre diz minha irmã: menos é mais.
3 comentários:
Que diferença, hein? Infelizmente, o som dos saxofones, hoje em dia, tendem para a repetição do estilo Brecker (que não é ruim - mas todo mundo toca igual, pô). repare na bateria, no baixo, no piano... putz!
Pois é... Não troco 200 Tim por essa noite no Blue Note. Fantástico!
Eu já sabia e te avisei Lester. Herbie Hancock como músico de jazz já era há muito tempo.
J L Mazzi
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