A droga do bebop foi a devastadora heroína, um poderosíssimo alcalóide capaz de aplacar qualquer dor e transformar a miséria mais profunda na felicidade mais lancinante. Além da forte dependência psicológica, a heroína é assustadora também por gerar uma enorme dependência física. Os terríveis danos que causa ao organismo explicam o porquê de seus usuários terem somente duas opções: ou largam o vício ou morrem. São raríssimos os casos em que o usuário desse elixir diabólico resiste por um longo período e morre por outros motivos. Eu só consigo lembrar de Art Blakey e Chet Baker. No caso específico de Chet, a intimidade com a heroína chegava às raias da monstruosidade: para ampliar e prolongar o efeito da droga, Chet injetava na veia apenas uma parte da droga contida na seringa. A seguir, sem retirar a seringa da veia, puxava sangue para a seringa, misturando-o à droga que sobrara. Ato contínuo, injetava mais um pouco da mistura droga-sangue na veia, depois puxava mais sangue para a seringa. Esse processo era denominado ‘punheta’ e era capaz de produzir sucessivos ‘baratos’ no usuário, ao contrário do ‘barato’ único que seria produzido pela injeção da droga de uma só vez. Outro expediente utilizado por Chet era o ‘speedball’ que consistia na injeção de uma dose de cocaína logo após a injeção de uma dose de heroína: assim, o efeito estupefaciente da heroína era compensado pelo efeito excitante da cocaína. Uma coisa fazia você se sentir o retardado mais feliz do mundo, a outra fazia você se sentir o gênio mais onisciente do mundo. Imagine o que essa mistura fazia com o corpo e a alma de Chet Baker.
Charlie Parker, talvez o maior gênio do jazz, entrou nessa onda e morreu afogado no vício aos 34 anos. Seu amigo e parceiro Red Rodney também mergulhou na heroína, mas conseguiu superar sua dependência e viver até os 67 anos. Como nos conta Gene Lees, em seu excelente livro Cats of Any Color: Jazz, Black and White, Da Capo, 2001, Red (o cara era ruivo) teve uma vida, ou melhor, nove vidas, passadas entre a alegria da música, o terror do vício, as clínicas de recuperação, várias prisões e algumas fraudes. Ao contrário da maioria dos livros sobre jazz, que quase nunca citam Red Rodney, Gene procura entregar a Red o justo reconhecimento pelo grande músico que foi. A tarefa não é simples, uma vez que Red é quase sempre lembrado, quando é lembrado, como o trompetista ruivo que tocou algum tempo com Charlie Parker (1949-1951). Poucos sabem que Red foi uma criança privilegiada, capaz de tocar de ouvido seu trompete, um autodidata que chegou à tocar em várias orquestras sem saber ler partitura. Red também gravou um dos melhores álbuns do bebop/hardbop que eu conheço: Fiery. Gravado em 1957 com Ira Sullivan (t, ts), Tommy Flanagan (p), Oscar Pettiford (b) e Philly Joe Jones ou Elvin Jones (d), o álbum traz algumas baladas e três composições originais, entre elas Red Arrow, onde Ira mostra que também é capaz de duelar com o trompete. Para os amigos navegantes deixo a faixa Star Eyes – clique AQUI para baixar a faixa (a senha é jazzseen) ou clique abaixo se quiser apenas ouvir. Até!
Red Rodney - Star ... |
3 comentários:
Kokain-Sucht kann mit Medikamenten nicht behandelt werden. Anders als bei einer Abhängigkeit von Opiaten wie Heroin oder Alkohol treten nämlich keine körperliche Schmerzen auf.
Red Rodney, outro excelente trumpetista ignorado pelos críticos, ditos conhecedores de jazz, americanos dentre outros. Sempre esteve 1000 furos acima do "endeusado" Miles Davis, mas não obteve o merecido reconhecimento, fato citado no livro de Gene Lees. Nunca deram muita importancia ao Red, inclusive sua discografia é pequena, foi pouco gravado. As grandes gravadoras americanas davam espaço a muitos "enganadores", em detrimento aos bons músicos ,como aconteceu com Rodney. Mas o que importa agora é podermos ouvir a sua música e seu "sopro" eficiente e empregnado de lirismo.
nao conhecia lester, muito bom
Postar um comentário