No sábado, cheguei cedo ao local do evento jazzístico. Eu fiquei aguardando uma garrafa de bourgogne pinot noir (La Vignée 2005, da família Bouchard), prometida pelo editor-chefe como uma pequena demonstração de arrependimento por não ter depositado meu fgts. Espera vã, claro. Foi o jeito eu me ocupar com a garrafinha de lolita doze anos que estava no meu bolso, enquanto curtia o som do competentíssimo pianista Kiko Continentino, que lidera o Sambajazz Trio (agora portando uma peruca a la príncipe Danilo - lembram-se disso?). Há algum tempo atrás (olha o pleonasmo aí, Edu), eu já havia comentado sobre a sua pegada com laivos do bebop e adjacências. E lá estava ele, sapecando os dedos no teclado com a maior intimidade. Luiz Alves, uma tradição do baixo acústico nacional, também soube mostrar seu suingue. Mas figuraça mesmo é Clauton Sales, também conhecido como Neguinho, pilotando bateria e trompete ao mesmo tempo, e, devo frisar, com competência. Se ainda existissem as figurinhas Eucalol, ele, com certeza, faria jus a ser uma daquelas carimbadas, e superaria aquela estampada com o baterista maneta (que o Reinaldo conseguiu na sua infância e mantém guardada até hoje).
Na seqüência, eu fui surpreendido por um grupo que sempre evitei (a dupla trabalha junto há 30 anos). O nome, Duo Fel, me fazia pensar em ressaca e bílis. Em nome do jornalismo verdade resolvi enfrentar a parada e descobri que de bilis a dupla Fernando e Luis (o fel vem das iniciais) não tem nada. Muito pelo contrário, o som foi vigoroso e alegre, com uma dose de lúdica paixão que me lembrou a performance de Joshua. Independente de o estilo ser ou não considerado jazz, os meninos fizeram aquilo que os bons jazzistas fazem: brincaram descaradamente com seus instrumentos. No final do show, fui obrigado a abraçá-los e contar-lhes do meu engano inicial e da minha constatação que o Fel, na verdade, é o diminutivo carinhoso de felicidade.
Logo após os dois shows iniciais, eis que aparece o editor-chefe com aquele sorrisinho amarelo e sabendo a vinho. Disse-me ele ter descoberto que Bud Shank é um degustador de primeira linha e que, ao ver a garrafa do bourgogne, meu ex-futuro-presente, suplicou por uma taça (a adega da pousada era bem fraquinha), a qual ele não pôde negar. Desculpa dada e aceita (ele mostrou a foto), restou-me torcer pro Bud não cair do banquinho.
Lester, desculpe-me a inconfidência, mas todos estavam pensando que o banquinho era por causa da idade do velho Bud; e eu, em nome do jornalismo verdade, não podia deixar o povo mal informado.
12 comentários:
Prezado Mr. Salsa, se não me apetecem os trios, imagine um unitário duo. Ainda fico com o quinteto de cinco do Omer, sem dúvida alguma o melhor show do Tudo é Jazz e, quiçá, de todos os tempos.
Nota da Redação: Com a queda do dólar e a redução do juro pelo Banco Central norte-americano, o segundo escalão do Jazzseen não poderá participar da fantástica feijoada com jazz na residência de Mr. Dedé. É chegada a hora de revermos as posições e reduzirmos a demanda marginal.
Pronto! Demorou! Desvia o vinho e agora a feijoada?!? Como dizia seu ex-patrão FHC: Assim não dá, assim não dá.
ve isso
http://www.youtube.com/watch?v=ZU5r4iJMh1M
(não tem nenhuma relação com o tópico)
vinicius
Muito interessante, Vinícius. É a tal mídia bem feita.
Mesmo com a declarada aversão do editor-chefe deste blog, encontrar um trio de piano, baixo acústico e bateria era tão freqüente quanto encontrar moças de vida nada fácil nos “night clubs” do Beco das Garrafas (RJ) e da Pça Roosevelt, região central de São Paulo, no meados dos anos 60 até o início dos anos 70.Essa febre tinha por origem a enorme influência e popularidade que esse tipo de formação obtinha nos EUA e, por extensão, mundo afora civilizado.Oscar Peterson ,Errol Garner com seus trios e o Three Sounds(a frente o pianista Gene Harris) talvez os mais populares mantinham agenda lotada com gravações e , principalmente ,apresentações ao vivo, com dinheiro em espécie pago ao final da noite.Essa “onda” , fertilizada nas dezenas de discos das novas formações, neste contexto, que chegavam por aqui, inspirarão as iniciativas nativas.Assim surgiu ,como num “passe de mágica” e carência de mercado, de forma positiva, o Som Três, 3 D,Sambrasa, Milton Banana, Jongo,Zimbo,Rio 65 entre dezenas de outros e o melhor de todos eles:o Tamba(com o maior pianista de jazz-bossa nova de todos os tempos, Luis Eça).Com a colocação de vocalizações, nem sempre afinadas, e a natural “influência do jazz” na mistura do samba(o mais representativo e sólido de nossos ritmos) e a adição da percussão, em alguns casos em detrimento a utilização solitária da bateria, se criou um produto de ampla popularidade e, por uma caprichosa coincidência do acaso, qualidade artística.Por essas razões fazer um disco e formar um grupo estável de samba jazz no séc XXI parecia ser um produto fadado a mofar nas prateleiras das lojas de discos q ainda resistem aos Down Loads e a pirataria.Sob o patrocínio da Guanabara Records, de um mecenas paulista q se aposentava do ramo de combustíveis e com as recomendações dos Consulares do CJUB , Beto Kessel e Gustavo, conheci esse trabalho.E ,enfim, mais de 30 anos após a extinção do Tamba, um grupo desse gênero consegue ,sem os vícios e recursos fáceis de uma experiência continuamente repetida, um disco excelente e solidificar na mais bela tradição(sem pejorativos) esse modelo (p/b ac /bat) , ainda inesgotado e indecifrado q quase a totalidade dos mestres de piano do Jazz ,nos últimos 60 anos utilizam, independente da corrente estética.Prezado, se me permite, Salsa,abandonar certos vícios envolve força e obstinação .Um dos hábitos mais freqüentes, um quase vício, q adquiri recentemente, e ler ,com imenso prazer, suas resenhas.Edú
Prezado Edu,
Reafirmo que suas informações são fundamentais para mim, ainda titubeante nessa seara. Percebe-se que o seu percurso é amplo e invejável, e, com certeza, enriquece a todos que por aqui ancoram.
Quanto ao trio do Continentino, não poderia ser outra a minha impressão: o som é de primeira. Tive o prazer de comprar os três volumes (aliás, dois, o terceiro ele me deu de presente) de suas próprias mãos, durante uma mágica apresentação realizada aqui em Vitória.
Ih, troquei as bolas. O que eu comprei foi do Stamato, que também faz um sonzaço.
Salsa, já foi cogitado q talvez somente a Espanha possa se igualar na media "per capita" de bons violonistas perante ao Brasil.Seus amigos do duo Fel, o duo Assad,Romero Lumambo, Yamandú(em certos momentos),Marcos Pereira,Ulysses Rocha,Mozart Melo,Heraldo do Monte,Turíbio Santos(mais próximo ao chorô e a música erúdita),Paulinho Nogueira e Raphael Rabello(in memorian)e o maior de todos eles ,Baden Powell, entre outros q seguramente esquecí,comprovam essa estatistíca do "bem".Hamleto( que nome pecúliar, héin)Stamato e um pianista, no minímo, exuberante .Minha avaliação dos 3 volumes do Speed Jazz são: vol 1 , "very speed".Vol 2 (o único q tenho) mais equilibrado, com um sensacional tema próprio chamado "chorô pra ele".Vol 3, disco absolutamente frio,execuções quase mecanizadas, sem emocão e pungência q a música ,antes de mais nada, exige.Um desapontamento pra mim.Boa apresentação mais tarde.Edú
Mr. Edú, eu até que aprecio alguns trios de piano, baixo e uma discreta bateria. Vide os de Tristano, Al Haig e Joe Albany. Mas minha coleção nessa seara é modesta - não passam de 300 ou 400 álbuns originais. Já ao vivo, nunca trocaria um bom quinteto (leia-se sax tenor, trompete e cozinha) por um excelente trio. Mesmo que esse trio fosse endeusado por medalhões e pela midea. Considerando que são em minhas orelhas que entram o som que escuto, confio mais no meu ouvido e no meu prazer.
E não me pergunte se haveria casos excepcionais, claro que sim. Como poderia esquecer do trio de Sal Mosca no Birdland de New York, em janeiro de 2007, poucos meses antes do mestre nos deixar? Ainda assim, para colorir a noite, Sal convidou um alto, um tenor e um trompete amigos para salpicar algumas jams durante sua apresentação.
Grande abraço, JL.
Lester vc é o cara, citar Joe Albany o pianista favorito de Charlie Parker exige um persistente estudo , dedicação e uma profunda compreensão do assunto.Fui mais obstinado em relação a trios, especialmente os de p/b ac/bat.É um modelo q resiste a epocas e a estilos de Earl Hines á Brad Melhdau. Não possuo tanto purismo como tú em ter albuns originais.Compro alguns 10 polegadas pelas capas, principalmente Dave Stone Martin.Tenho me dedicado ao golfe com afinco, pela extrema compulsividade q sustentei durante quase 20 anos.Precisei,em razão dela, comprar um imóvel exclusivamente pra colocar meus livros, ap de som e cds, video lasers e agora dvd(ainda bem, nem tantos).E quanto ao Mosca, sabia, no máximo, q era um discípulo do Tristano.Ambos sofremos a experiência intensa da música, essa mesma q com momentos comoventes e mágicos adicionou um grande bem-estar em minha vida.Saldo dessas aventuras exploratórias quando houver conveniência nesse blog ,serão oportunamente relatadas.Edú
Mr. Edú, de fato Sal gravou pouco, se expôs pouco. Conforme ele mesmo me confidenciou, não pulsava nele a verve pelo confete ou aclamação. Preferia tocar, estudar e ensinar. Grande figura.
Quanto aos esportes radicais, troco nossa partida de peteca por uma demorada visita a nossos acervos. O vinho o convidado leva.
Grande abraço, JL.
Eu posso levar um garrafão de suco de uvas natural Dani de 5 litros vendido no km 157 da via Dutra e q regularmente passo quando vou a fazenda de minha familía.E conto tb com suas valiosas informações ,entre um drive e outro de nossa partida, previamente combinada.Edú
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