01/06/2008

Sassy

Na constelação das divas do jazz, Sarah Vaughan, na maioria da vezes, é a previsível suplente entre os amantes de Billie Holiday e os adoradores de Ella Fitzgerald. Se Billie fazia de sua vida pessoal uma extensão mais dramática e cinzenta dos seus sofridos blues, Ella, sempre foi a pessoa a ser protegida - pela doce impressão juvenil que causava sua voz. Sarah, porém, aprendeu menina que caso quisesse “escapar” de sua realidade social: pai, carpinteiro (guitarrista nas horas vagas) e mãe, lavadeira (vocalista do coral da igreja), deveria aperfeiçoar o uso da dádiva recebida - a mais rica e bela voz surgida no jazz. Sarah Lois Vaughan nasceu em Newark (NJ) no dia 24 de março de 1924.Aos 7 anos e por interferência materna começou estudar piano sendo ,aos 12, organista da Igreja Batista, além,de solista no coro. Em outubro de 1942, vencia inesperadamente o concurso de calouros do Apollo Theatre em NY, cantando “Body and Soul”. O cantor Billy Eckstine presente , extasiado, a recomenda ao pianista - que tentava ser “band-leader” - Earl Hines pra contratá-la como “crooner” e pianista substituta. Aceitando o convite, Vaughan participa de forma “ocasional” da primeira experiência, em 1943, de um grupo com objetivos comerciais de bop com Dizzy Gillespie e Charlie Parker nos sopros intitulado “Earl Hines Bebop Orchestra”. De vida breve, esse “combo” foi reiniciado um ano depois com o acréscimo de Art Blakey e Miles Davis. Nesta vez, tendo Eckstine em sua liderança. Por iniciativa de Leonard Feather, grava em 31 de dezembro de 1944 uma série de quatro “takes” - com Gillespie no grupo. O destaque é a sua interpretação de “A Night in Tunisia”, tema mais popular de Dizzy. Apelidada de Sassy (tradução livre e conservadora: brejeira), por “maliciar” em alguns momentos trechos de canções ,toma como segundo lar o ambiente musical do bebop.Quando a questionavam por que em razão de seu fabuloso alcance de contralto de três oitavas e do vibrato poderoso não se tornava uma cantora lírica, respondia ,contrariada, como alguém poderia considerar o jazz uma forma inferior de música.Diante da magnitude e versatilidade de sua voz e das obrigações comerciais inicia um ciclo de gravações de “baladas” com grandes grupos entre 46-49 ,uma delas o primeiro registro de “Tenderly” . Assina , em 49, com a Columbia por cinco anos que lhe dirige a carreira a tornar-se uma cantora mais “pop”, para os padrões da época.Com o contrato expirado,em 54,entra na Mercury,onde se reaproxima do jazz gravando com Cannonbal Adderley e Clifford Brown. Em razão de seu virtuosismo, consegue facilidade em vocalizar qualquer espécie de repertório e formação instrumental, seja na forma de trio a uma grande orquestra. Vaughan começa, no entanto, a distanciar-se do ambiente do jazz a partir de 56, tomando o rumo definido como “parajazzístico”. Nunca tornou-se um “estouro” comercial, mas uma artista reverenciada por seu timbre, disciplina e exuberância técnica.Manifestada em seu segundo apelido concedido pela atriz e dançarina Sarah Bernhardt: “Divina”. Durante as décadas de 60, 70 e 80,gravou pelos selos Roulette,Pablo e Columbia “colecionando carimbos no passaporte” nas extensas turnês mundiais.No Brasil, gerou folclore pelo hábito de tomar conhaque misturado a coca-cola como se fosse “gatorade” durante os ensaios.No meio dos anos 70, sentindo as portas fecharem-se pra si e para os tradicionais artistas de jazz nas grandes corporações fonográficas, entra para o minúsculo selo “Pablo” de Norman Granz, empresário de Ella. Nele, cercada por músicos que praticamente albergavam-se contra o anonimato artístico,realiza alguns belos álbuns já com voz madura, utilizada de forma mais equilibrada e espontânea na companhia de Oscar Peterson, Joe Pass, Ray Brown, Jimmy Rowles(p), Count Basie e Louie Bellson (bat) entre outros “professores”. Retornava, assim, ao seu “habitat”, o inicial da carreira, onde surpreendia atravessando prazerosamente às noites sentada ao piano - que tocava de forma convincente, em companhia de um pequeno grupo de músicos “escolados”, deslizando sua mãos na busca das harmonias e idéias melódicas que decifrassem a intrincada linguagem do bebop. Sarah morreu de forma precoce aos 66 anos em 3 de março de 1990, vítima de um câncer no pulmão. Tinha acertado com Quincy Jones um disco dos recentes compositores brasileiros. Diante de seu derradeiro trabalho,“Brazilian Romance”, foi poupada, pela ação “divina”, de outra experiência constrangedora. Sarah Vaughan tem um universo de gravações imenso e extremamente desigual. Até mesmo gravou poemas musicados do Papa João Paulo II. Em virtude de já ter escolhido autores melhores (gravou os songbooks de Duke Ellington e George Gershwin) tomo a liberdade de sugerir cinco títulos aos visitantes: Sarah Vaughan with Clifford Brown – Emarcy ( lançado em edição nacional), No Count Sarah – Emarcy, After Hours – Roullete, How Long Has This Been Going On? – Pablo e The Duke Ellington Song Book Two - Pablo. Para os amigos ( ). Boa audição.

13 comentários:

Anônimo disse...

Beleza de resenha, sòmente senti falta de algumas faixas como "aperitivo", como costuma acontecer nas resenhas do Jazzseen...

John Lester disse...

Prezado Edù, obrigado por mais uma excelente colaboração.

Grande abraço, JL.

Anônimo disse...

Muito bem lembrado, Edu, apesar da falta de sucesso comercial, considero uma das vozes femininas das mais presentes no inconsciente coletivo, principalmente em filmes, e outros ambientes ditos "cult" ou "marginais".
Grande e marcante voz

Danilo Toli disse...

estive com o lester ontem e ele me disse que esta dificil de colocar musicas - o boomp3 esta engarrafado

Salsa disse...

Boa resenha, Edu.

Rogério Coimbra disse...

Suplente?? Pegou mal.

Anônimo disse...

Liga não Edù, o Rogério (ou seria Astolfo?) gosta de ouvir Julie London. Pode?

Anônimo disse...

blog bom hein, nao conhecia

Anônimo disse...

Amigos, agradeço sempre sua atenção ,consideração e opinião às minhas rudimentares palavras.Edú

Anônimo disse...

Jazzseen , sempre atento, colocou ao menos uma faixa na bela voz de Sarah Vaughan! Embelezou o post!

Unknown disse...

Suplente?
hehehe...esse cara é um pândego...tem certas coisas que nao se deve falar...ficar de boca fechada é melhor...

Beto Kessel disse...

Tive How long has this been going on em vinil...Um album que cansei de ouvir...Atraves dele, me lembro da grande Sarah Vaughan...

Abracos,

Beto Kessel

Anônimo disse...

Kessel,sua opinião é sempre bem vinda.A casa é sua.Edú.