03/05/2009

Lenda Viva - Howard Rumsey

Da infinidade de grandes músicos de jazz sobre os quais ainda não tivemos oportunidade de prestigiar, selecionamos hoje o contrabaixista e líder Howard Rumsey (1917). Após dois anos de interação, em 1953 os três expoentes do primeiro The Lighthouse All-Stars - Shorty Rogers, Jimmy Giuffre e Shelly Manne - partiram para formar o Shorty Roger's Giants. Os próximos expoentes seriam Bob Cooper, Bud Shank e Claude Williamson, reunidos de 1953 a 1955 e responsáveis por importantes experiências com flautas e oboés no jazz, registradas em gravações memoráveis para a Contemporary. Foi desde 1948 no Lighthouse Cafe, em Hermosa Beach, California, sob o comando discreto de Rumsey, que muito do jazz moderno foi feito. Distante cerca de 50km de Hollywood, poucos residentes ou turistas empreenderiam viagem para ouvir esses músicos desconhecidos tocando uma música bastante estranha para a época. Um contato mais direto do jazz moderno com um público ilustrado ainda estava por vir. Alguns anos antes do Lighthouse acontecer, Dizzy Gillespie e Charlie Parker andaram aprontando as suas por alguns clubes de Hollywood, onde eram, na melhor das hipóteses, ouvidos por outros músicos bem informados. Muito lentamente o bebop foi conquistando a California, levando alguns músicos a experimentações que, nos anos seguintes, resultariam no surgimento do jazz West Coast. É nesse período que Rumsey inicia suas atividades no Lighthouse Cafe, partindo do princípio de que o jazz moderno poderia ser popular e viável economicamente sem concessões que pusessem em risco sua dignidade artística. Quebrando o sectarismo que caracterizaria os primeiros grupos do West Coast, Rumsey conseguiu reunir em seu clube uma infinidade dos mais importantes músicos de jazz californianos, estabelecendo um intercâmbio notável de influências, preferências e versões, sem falar no sucesso de público que fez daqueles anos os proprietários de uma das músicas populares mais ricas de que se tem notícia. 

Até mesmo os mais inóspitos e carrancudos gênios do jazz, muitos dos quais temiam não ser compreendidos diante de um público leigo, sorriam ao verificar o calor daquela casa, atenta e sedenta por experimentos e inovações. Howard Rumsey nasceu em Brawley, California e desde criança adorava música. Estudou pianoa durante oito anos, depois aprendeu bateria no colégio, chegando a tocar na Banda Municipal. Após a Lei Seca, muda-se para Los Angeles, estudando no City College e aprendendo sozinho o contrabaixo a partir de seus conhecimentos de piano. Em 1938 é o contrabaixista do conjunto de Vido Musso, onde conhece o pianista Stan Kenton. Partindo em turnê para o leste, toca durante 16 semanas no Blackhawk em Chicago, cidade que o levaria a conhecer Professor Jiska, primeiro contrabaixo da Sinfônica de Chicago, de quem recebe suas primeiras e únicas aulas do instrumento. Retornando a Los Angeles, aceita o convite para integrar a primeira banda de Stan Kenton, apresentando uma série de arranjos inovadores pouco aceitos tanto na costa leste quanto na costa oeste. Depois de trabalhar com inúmeros conjuntos, grandes e pequenos, do Dixieland ao Bebop, Rumsey finalmente realiza em 1948 o primeiro concerto de domingo no Lighthouse Cafe, empreendimento que comprova ser possível oferecer música de alta qualidade para um público amplo. Para os amigos fica a faixa The Song is You , retirada do álbum Howard Rumsey's Lighthouse All-Stars Volume Three, gravado entre 1952 e 1955. Com ele estão Shorty Rogers (t), Frank Rosolino (tb), Jimmy Giuffre (ts), Herb Geller, Bud Shank (as), Claude Williamson (p) e Max Roach (d). Lenda é lenda.

27 comentários:

Paula Nadler disse...

Que delí esse jazz west coast. Obrigada Roberto.

Salsa disse...

Depois de uma noite agradável, ao chegar em casa (4:15) e ainda posso ouvir Howard Rumsey. Só faltou o café e algumas frutas. Beleza.

John Lester disse...

Algumas noites nunca têm fim. Obrigado Mr. Scardua.

Érico Cordeiro disse...

Linda versão de "The Song Is You" - suingante e com solos magníficos. West coast da melhor qualidade. Parabéns pelo bom gosto, Mr. Scardua.
Abraços a todos, em especial ao "Jedi" Salsa (que saudade da época em que eu podia chegar às 4:15 em casa!!!).

PREDADOR.- disse...

Intolerável esbórnia.

Andre Tandeta disse...

Uma questão tecnologica me impede de apreciar a musica aqui postada.O player não esta tocando. Tentei varias vezes e nada. Uso Firefox e nem tenho mais Explorer.
Mas imagino a altissima qualidade musical,como sempre.
Quem souber o que fazer,por favor avise. Serei obrigado a voltar para o Explorer?
Abraço

Sandra Leite disse...

Começar a segunda-feira pós feriado com Música é pra lá de bom:)

Obrigada, Mr Scardua!

bjo

Danilo Toli disse...

Que pena o amigo Tandeta não poder desfrutar desse saboroso petisco musical. Valeu Roberto!

Andre Tandeta disse...

Algum milagre aconteceu e esta tudo funcionando,todos os players ao mesmo tempo mas isso sempre foi assim aqui comigo.
Excelente essa gravação. Solos e conjunto de altissimo nivel.
Gostaria que alguem me explicasse no que o tal de West Coast Jazz é diferente do jazz que se fazia em Nova York,por exemplo. A não ser pela geografia e a cor da pele dos musicos da California ,brancos quase todos, o que eu ouço é bebop, praticamente igual ao de Nova York.Os solos são todos com vocabulario 100% bebop,é só ouvir. Max Roach na bateria reforça mais ainda a similaridade, é ele quem esta em quase todos os registros gravados por Charlie Parker. Quem souber por favor me explique. Mas creio ser daqueles rotulos que nada querem dizer. Shelly Manne em uma entrevista pra televisão na decada de 60(ver youtube) declarou que o que ele e seu quinteto faziam era "no coast jazz". Ouvindo,sinceramente ,não da pra dizer que é outra coisa que não bebop.
Abraços

edú disse...

Saúdo, por aqui, o blog de nosso colega de família de “blogs de jazz” - Érico Cordeiro.Como na entrada do blog do Sr.Cordeiro tem uma “catraca restritiva” ( q sugiro a retirada para facilitar acesso) o faço agora,com a permissão dos visitantes. O blog obedece a primeira regra básica ,na minha opinião, é bem escrito ,bastante informativo e parcimonioso nos adjetivos.Merecendo visitas freqüentes ao território de uma das mais interessantes culinárias regionais.Muito sucesso e visitas.
Mano velho, segundo meu amigo Ruy Castro a diferença do West Coast para o East Coast e q apesar de surgirem radiantes, felizes e impecavelmente bronzeados nas capas de seus lps os músicos do West Coast consumiam mais combustível.

Érico Cordeiro disse...

Caros amigos do Jazzseen.
Em primeiro lugar, agradeço as palavras gentis do Mr. Edú e peço desculpas pala tal catraca (na verdade nem sei o que é e nem como se faz para tirar - vou consultar minha assessora para assuntos informáticos e fotógrafa de mão cheia Fafá Ramos). Assim que souber como tirar o "bicho" de lá eu o faço.
West Coast é só um rótulo (embora as músicas, mesmo as baladas, tenham uma cara mais alegrinha), mas que pegou! Em homenagem a esse belo post, catei meus discos do Shorty Rogers, em especial uma coletânea da Propper, com 4 cd's, trabalho gráfico primoroso, libreto e fotos. Lá está registrada parte da história dos Lighthouse's All Stars e dos Giants, com ótimas fotos daquele pessoal todo (Mulligan, Giuffre, Manne, Pepper e até do Rumsay).
Forte abraço a todos

John Lester disse...

Sim, não posso negar que identifico algumas diferenças entre o jazz de NY e da CA no período em apreço. Nem tanto na velocidade, que um Art Pepper ou um Bud Shank quase encostavam em Charlie Parker e Sonny Stitt. O panorama exposto pelo amigo Edù - sol-chuva & calor-frio & bronze-ébano - talvez determine a impressão que tenho: na CA temos um som de brisa ensolarada, quase etérea em certos momentos, um doce sopro no rosto, mais ou menos veloz de acordo com o balançar das ondas e o caminhar das moças. Já em NY, percebo mais as rajadas geladas de um trompete incandescente, suplicando à prostituta mais uma dose de heroína na veia.

Na verdade - e meu ouvido não é nada bom - sinto claramente em NY um jazz mais encardido - dirt - onde energia e revolta parecem preceder as exigências do intelecto. Já sob o sol incendiário da CA, percebo jovens universitários curiosos experimentando de tudo: álcool, mulheres, heroína e jazz. O único defeito desses jovens: trataram o álcool, as mulheres e a heroína com o corpo, mas trataram o jazz com o intelecto.

E se você, amigo leitor, não entendeu nada do que eu disse, ouça Dave Brubeck e Bud Powell.

E amigo Edù, não estou certo se os garotos da CA viajavam mais que NY. Art Blakey, por exemplo, injetou heroína por toda a vida, superando o insuperável Chet Baker.

E que venham os blind tests!

edú disse...

Prezado Lester,
apenas reproduzi as palavras ditas pelo Ruy.Nessa competição insana - Bill Evans foi dependente de heroína por 20 anos sem dar "cano" em nenhuma apresentação - só Art Pepper ficou vivo para contar na comovente e até certo ponto ultrajante autobiografia "Straight Life"

Andre Tandeta disse...

E a musica?
Nesse exemplo aqui postado não ouço nada dessas diferenças ,pra mim literarias. É bebop,ponto. Eu entendi o que o Sr. quis dizer,Mr.Lester, mas não esclareceu a questão: qual é a diferença musical? De todo modo suas impressões e observações são muito interessantes,ainda que nada tenham a ver com a musica.
Abraço

John Lester disse...

Já amanhece e se o amigo Tandeta não percebe a diferença entre Dizzy Gillespie e Shorty Rogers tocando You go to my head, ou entre Charlie Parker e Art Pepper tocando You go to my head, ou entre Dave Brubeck e Bud Powell tocando You go to my head, estamos diante de um caso grave. Talvez seja necessária a quarentena.

E não me venha dizer que tudo é bebop ou que tudo é west coast porque é tudo You go to my head.

A diferença musical, prezado Tandeta, não pode ser colocada em partituras, nem em teses, nem arrefecida pelas Transformadas de Laplace. A diferença, prezado Tandeta, ou você percebe, ou não.

Aí a beleza do jazz: naquela semifusa insinuada e que, apesar de ausente, soa.

Grande abraço, JL.

Andre Tandeta disse...

Bom dia Mr. Lester.
Percebo que é melhor deixar pra la.
Abraço

John Lester disse...

Esse não é meu amigo Tandeta que conheço, rs.

Grande abraço, JL.

Salsa disse...

Estava lá no meu quintal ouvindo Howard McGhee, num disco gravado em LA, em 61. Ao meu ouvido, a distância está no modo mais contido de tocar, uma redução do registro agudo (muito usado nas big bands), notas escolhidas (McGhee comenta sobre a volúpia do bop), arranjos mais harmoniosos(com vozes bem articuladas), enfim, acho o pessoal da costa oeste menos "agresivo" do que o pessoal de nova iorque. Ainda mais quando o hard bop afiou suas garras. A costa oeste é, em determinado momento, cool. Só isso.

Érico Cordeiro disse...

Prezado Edú,
Acho que consegui desativar a tal catraca que restringia os acessos. Pode tentar postar um comentário agora - postei uma resenha sobre o grande Kenny Dorham e espero que você goste.
Contribuindo para o debate sobre West Coast x bebop ortodoxo, Salsa foi preciso como sempre: há uma certa agressividade no toque dos caras de NY, um sentido mais percusssivo nas notas. O pessoal do West Coast "pega mais leve" - sem perder em ritmo, melodia ou harmonia - muito menos em capacidade técnica. É, mal comparando, como o samba-jazz feito no Beco das Garrafas e o mesmo samba-jazz que rolava no Juão Sebastião Bar - ambos são geniais, mas o som do pessoal de São Paulo tinha uma certa urgência, uma característica mais urbana (até mesmo nos nomes das músicas se percebe isso). Como disse Mr. Lester não dá prá explicar, mas dá prá sentir.
Abraços a todos

edú disse...

O proprietário do Juão Sebastião bar - Paulo Cotrim foi o pioneiro na crítica gastronômica paulistana.E foi o primeiro dos críticos a pesar o custo/beneficio de "se comer bem fora de casa".Sabiamente dizia q nada superava um arroz soltinho com feijão de caldo rubro acompanhado de pequenos pasteis de queijo e uma carne seca desfiada fininha na manteiga.A banana a milanesa ficava a critério dos q seguiam "dieta".

Salsa disse...

hmmmm, rolou a tal da fome da madrugada...

Andre Tandeta disse...

Mr. Lester,
sou eu mesmo.
Reafirmo minha mais profunda admiração pelo Sr. e todos os seus colaboradores que fazem do Jazzseen um lugar especial onde o jazz,a inteligencia e o humor estão sempre juntos.
Nesse caso fiquei com a impressão, talvez errada, de estar indo com meus comentarios para um lugar, digamos,indevido,essencialmente tecnico,"papo de musico". A troca de ideias é o que me motiva a vir aqui comentar e interagir com os amigos. Por deficiencias de comunicação de minha parte meu ponto de vista não foi compreendido. Assumo a falha.
Vamos em frente.
Abraços,com respeito ,admiração e carinho,
ANDRE

Sergio disse...

Bem amigos da rede, curtindo - e a vera - fiquei eu, não entendendo nada sobre as diferenças entre o som do West ou do East. Se mais ao sol q os aquece ou à brisa q entorpece... Ouvir, ter o prazer de conhecer, Howard Rumsey's Lighthouse All-Stars - Oboe-Flute (54); howard rumsey's lighthouse all stars - double or nothin' (57) ler a reseinha e a discussão q se seguiu here: vagabundo chegando da night, enlaricado, outro acordando e o papo rolando foi bem ilustrativo. Acho q postarei em breve os dois álbuns. Principalmente o 2º q conta com Lee Morgan, Winton Kelly e Benny Golson, brincando de dar o que falar - o dobro ou nada.
Valeu.

Sergio disse...

Mudando de fio a pavio:
Esse tem endereço certo. Vai diretamente ao sr. Edu. E antes dos excessos, cometerei alguns (q fazer se não consigo controlá-los?) antecipo q é só um chiste, seu Edu:

o senhor conhece, claro, ms. Eartha Kitt, pois não? Poizé, pra mim está sendo um prazer atrasado. E devo dizer-lhe q o culpado disso é o sr. Explico. Corria atrás do Shorty Rogers & His Giant, citado nesta coluna, quando topo com o álbum “Eartha Kitt - St. Louis Blues - With Shorty Rogers & His Giant”.
Earha é (infelizmente, já era) uma belíssima negona nascida na Carolina do sul, em 17 de janeiro de 1927 e falecida em Weston CT, 25/12/2008... que canta - que grata surpresa! - à francesa, tal e qual Edith Piaff!... Não é um acontecimento e um diferencial interessante?

Poizé 2, a missão, seu Edu: pois agora vejo mais! Eartha tbm participou do seriado (de TV) Batman nos meados dos 60s. Foi a Mulher Gato, a Eartha! Desaprovada pelo público, 3 episódios depois, pelo fato de que, gato ou gata, sendo preto dá azar pros sobrinhos do San! “Esconjuro e correção! Que massada, Batman! Gata, mesmo sendo mulher, lânguida mulher - e que delícia de mulher!, pra quem gosta -, preta não pode! – indignariam-se o Robin e os do clan do cuzcuz, num hemisfério bem mais acima da Bahia...

O que tens com o peixe, seu Edu? Ora se voffa exfelência, que fempre nos participa dos falecimentos “da turma” – olha quem está falando agora. “Ou feja, é tbm o cara do obituário... Como assim, efquefeu-fe... de nos participar... do paffamento... de missis Eartha... ou feja, ainda ontem na hora da feia de natal?” - feia é a Mariva, craro.

Daí que, concluindo, graças ao senhor, senhor Edu, já que a minha cultura jazzy, carece de educação, deixei de conhecer Ms. Kitt, no mínimo, com 5 meses de atraso!... Lamentável, moço, lamentável... Postá-la-ei agora, tipo na próxima, para prestar-lhe, a ela e só a ela, a devida homenagem.

edú disse...

Prezado Sérgio,
Eartha Kitt foi contemplada num bonito perfil - originalmente escrito para o jornal O Estado de São Paulo - por Ruy Castro em seu livro "Tempestades de Ritmos" (coletânea de artigos sobre música da editora Cia das Letras em 2007).Um dos motivos do entusiasmo de Ruy para realização do artigo e q havia saído uma caixa com várias gravações dela.Cheguei a olhar e manusear o produto em si. Achei bem kitsch - sem esforço do trocadilho.Eartha tem mais relevância como corajosa defensora dos direitos civis , na minha opinião, numa época em q negros eram impedidos de dividir o mesmo ambiente q os brancos em mais de 50% dos locais públicos dos EUA.O público dela, sem demérito, era o de Las Vegas onde fazia longas temporadas por anos consecutivos e a deixou milionária.Sinatra gostava dela.Estou em falta contigo, não esqueci, a respeito da gaja.Abraço.

Sergio disse...

Sem pressa com a gaja, Edu. Mas nessa ainda te aguardo a opinião.

Contudo gostei a beça da Eartha, camarada. Quando escrevi minha provocaçãozinha pra ti, ainda estava começando a ouvir. Agora tou fisgado. Tanto q tou preparando mesmo uma postagem. No fim acho esse assunto, vozes femininas, um assunto pra lá de espinhoso. Achei diferentaça a voz dela - assim, diferente da totalidade das cantoras americanas.

Anfã, me aguarde, pois postarei.

Érico Cordeiro disse...

Eartha é kitsh, decerto; mas a versão de "C'est Si Bon", com aquele climazinho de cabaré (ou cabaret, que é prá ficar mais chique) é maravilhosa.
E ela ainda fez o papel da Bat-Girl, naquele seriado (pai de todos os kitshs do universo) estrelado por Adam West.
Grande felina!!!
Abraços