O indecoroso bolodório havido na última reunião do Clube das Terças – o mais antigo e longevo clube de jazz capixaba – deveu-se a uma atitude aparentemente isenta de dolo: nosso amigo Chico Brahma retirou de uma belíssima sacola da Casa Bonita – simpática loja capixaba de objetos de arte e decoração – um debilitado álbum de George Auld, denominado That’s Auld. Em seguida, anotou que se tratava de um excelente disco de jazz, gravado em 1949 e que injustamente não constava no All Music Guide. Desencadeou-se, daí, alvoroço e tumulto de tão imensa amplitude que o primeiro a fugir do local foi Reinaldo, emérito presidente do Clube, e Garibaldi, seu fiel escudeiro e editor. O sócio André, sempre querendo aparecer mais do que sua estatura permite, iniciou longa dissertação sobre a excelência atual dos vinhos canadenses, sobremodo a partir de 1974, com a instalação da vinícola Inniskillin, produtora de soberbo ice wine, feito com base no Eiswein alemão a partir das uvas Vidal e Riesling, que congelam nas vinhas. João Luiz, socando a mesa e derrubando diversos cd’s piratas que por ali repousavam, perguntou que diabos tem a ver George Auld com ice wine, no que John Lester respondeu prontamente: os dois provêm do Canadá, meu nobre amigo. Do alto de sua elegância e malacia, Lester iniciou caudalosa biografia do moço, ressaltando que, nascido em Toronto, em 1919, parte para os EUA na década de 1920, fixando-se em New York, onde consegue trabalho como saxofonista alto. Em 1936, influenciado pela sonoridade de Coleman Hawkins, passa a tocar o saxofone tenor e, antes de formar seu próprio grupo, ingressa na banda de Bunny Berigan. Lembrando que no Canadá o frio necessário para a produção do ice wine ocorre com mais regularidade que na Alemanha – as uvas são colhidas tardiamente, nos anos em que a temperatura cai abaixo dos 8 graus Celsius negativos, sendo então prensadas e a água congelada é retirada do mosto que, após fermentação, produz um vinho de sobremesa extremamente concentrado e sensual – Lester fez lembrar que, por recomendação de Billie Holiday, Auld é convidado a integrar a banda de Artie Shaw, em 1939. Antes, trabalharia ainda para Jan Savitt e Benny Goodman, até que, em 1943, forma seu próprio grupo, com a presença de músicos como Serge Chaloff, Erroll Garner, Dizzy Gillespie e Stan Levey. Nisso retorna à mesa Reinaldo que, com sua presidencial figura, arremata: embora tivesse capacidade técnica para manter-se firme no mais exigente contexto bop, Auld perambula por big bands do swing, como as de Billy Eckstine e Count Basie. Inquieto, tenta, sem sucesso, a carreira de ator, ao mesmo tempo em que toca em filmes e na televisão, principalmente em Los Angeles. Nem mesmo o câncer lhe retira o fôlego, partindo Auld em inúmeras turnês, inclusive no Japão, onde alcança fragoroso sucesso. Apesar dos estalidos e ressaltos, deixo para os amigos a faixa Mr. Pepper , retirada do lp da Brunswick que Chico Brahma gentilmente nos ofertou.
Caso ainda reste alguma dúvida sobre ser ou não Auld um tenorista do jazz, recomendo sem traumas o álbum Homage, gravado em 1959 para a Xanadu. Nele Auld presta homenagem aos seus tempos com Benny Goodman, Charlie Christian e Cootie Williams, tocando clássicos do swing na companhia de Don Fagerquist (t), Lou Levy (p), Larry Bunker (vib), Howard Roberts (g), Leroy Vinnegar (b) e Mel Lewis (d). Para os que preferem a pegada west coast, o álbum In The Land of Hi-Fi é a melhor opção. Gravado em 1955 para a EmArcy, conta com a presença brilhante de músicos como Maynard Fegurson (t), Frank Rosolino (tb) e Arnold Ross (p). Saúde!
31 comentários:
Cheguei na hora certa. Só falta o vinho.
Ah, eu não participei da discussão. Na próxima terça, lá estarei para o rescaldo.
PS - o Predador ameaçou invadir o blog do Érico se ele postar alguma coisa sobre o Miles. Pelo jeito, teremos duelo no domingão
auld é nocivo
Li no Jazzigo, antes de tornar-se Jazz Backyard,q Auld foi “o dublê de sopro” de Robert de Niro em seu papel de saxofonista no filme New York,New York.Caso clássico de película relativamente desconhecida em razão do estrondoso insucesso e canção, paradoxalmente, hit de “todas às festas”.No entanto , a mistura de George Auld mais vinhos canadenses e cds pirateados traciona qualquer motor V8.
Li no Jazzigo, antes de tornar-se Jazz Backyard,q Auld foi “o dublê de sopro” de Robert de Niro em seu papel de saxofonista no filme New York,New York.Caso clássico de película relativamente desconhecida em razão do estrondoso insucesso e canção, paradoxalmente, hit de “todas às festas”.No entanto , a mistura de George Auld mais vinhos canadenses e cds pirateados traciona qualquer motor V8.
Mais um prá minha coleção de músicos a serem descobertos. Só o conhecia de nome, embora tenha alguma coisa em big bands e acompanhando Lady Day.
Mr. Lester anda se superando - como se isso fosse alguma surpresa!!!
Grande abraço a todos e, Mr. Salsa, por favor, não fique em cima do muro. Venha dar a sua contribuição em prol da causa milesista (vale pedir voto? - tomara que o Ayres de Brito não freqüente esse blog, porque senão ele pode querer me cassar!!!). Mr. Edú, o mesmo vale para a sua excelsa pessoa!
Abraços a todos.
He was back with Shaw in 1942, and then led his own big band (1943-1946), an excellent transitional unit between swing and bop that at various times included such young modernists as Dizzy Gillespie, Erroll Garner, and Freddie Webster; Sarah Vaughan also guested on a couple of his recordings. After the band's breakup, Auld led some smaller groups that tended to be bop-oriented. He was with Count Basie's octet in 1950 and then freelanced for the remainder of his career, maintaining a lower profile but traveling frequently overseas and not losing his enthusiasm for jazz. Some may remember that, in 1977, he had a small acting role as a bandleader and played Robert De Niro's tenor solos in the otherwise forgettable Liza Minelli movie New York, New York.
Poia é, meu povo,
O Predador ameaçou mas não cumpriu. Voltou para vênus sem invadir o blog do Érico.
Auld é uma figura bastante interessante. O lance do dublê é verdade.
Mr.Lester,
Auld foi um excelente saxofonista. Seu estilo de tocar transitava entre o swing e o bebop com fluencia e personalidade. No filme lembrado por Edú ,em que ele é o som para o sax tenor "tocado" por Robert De Niro ,ha passagens realmente magistrais,confiram . Creio que não é um caso isolado de musico com dominio do vocabulario de bebop e sonoridade mais "antiga",digamos assim. Dexter Gordon é considerado o pioneiro nessa transição do estilo de tocar do swing( no caso dele com uma fortissima influencia de Lester Young)para as inovações do bebop. Seria uma fusão. Creio que Auld (mais influenciado por Coleman Hawkins)tambem foi um dos primeiros a adaptar para o tenor a linguagem criada por Charlie Parker. Se não for pedir demais gostaria de ouvir pelo menos uma das faixas desse disco "Homage". Acredito que seja mais ilustrativa disso que falei acima alem da curiosidade.
E gostei muito da expressão "pegada west coast". Pra mim define perfeitamente o que é o jazz west coast: o vocabulario do bebop com uma sonoridade mais suave,uma questão de pegada. A musica, ao contrario de alguns vinhos, viaja muito bem.
Abraço
Mr. Tandeta, folgo em "vê-lo" aqui em uma das nossas casas virtuais.
Parabéns pelo excelente "Uma guitarra no Tom" e, por favor, dê as minhas singelas congratulações aos demais companheiros de viagem, os mui dignos Sérgio Barrozo e Victor Biglione.
Seu comentário, mais o do Edú e a ótima resenha do timoneiro Lester despertaram a vontade de conhecer esse grande músico. Mais um prá listinha que cresce geometricamente!
Abraços a todos.
o blog está 10:
a proposta de mostrar músicos desconhecidos
o visual
os comentários
Parabéns!
Prezado Mr. Tandeta, que bom percebê-lo aqui no Jazzseen novamente. Espero que tudo tenha corrido bem na Espanha. Se tiver chance, conte as novidades.
Prezado Mr. Pitta, obrigado pela visita, sempre gentil.
Aos demais, um grande abraço.
E viva o jazz!
super saudade do jazzseen :)
Como aprendo com essa gente...
Oi Lester,
muito bom o seu texto na coluna "Jazzseen Recomenda" aí ao lado: justo e merecido.
Parabéns a você e ao Érico!
Valeu ,Erico!
Mr.Lester,
depois da rapidissima viagem a Espanha com Wilson Das Neves aconteceram semanas de muito trabalho e realmente não deu pra aparecer por aqui. A viagem foi otima mas sem nada de extraordinario pra contar aos amigos. Novidades são muitas mas serão contadas aos poucos. A primeira ,que nem novidade é mais,é o lançamento do disco do Victor Biglione Trio tocando Tom Jobim.Fizemos alguns shows por conta disso e como sonhar não custa nada(por enquanto) torço para que a gente tenha a oportunidade de tocar ai em Vitoria. E tambem São Paulo e São Luis . Afinal é onde estão os amigos do Jazzseen. Cataguazes tambem ,claro ,mas o amigo Olney sempre vem ao Rio.
De todo modo aguardo uma prometida caixa de CDs por parte da Delira Musica para enviar ao Sr. um exemplar. Posso?
E o Jazzseen segue cada vez melhor . O Sr. esta de parabens pelas otimas resenhas sobre musicos relativamente desconhecidos para quase todos nos mas que são excelentes e ate diria importantes. É um grande prazer ler seus textos e escutar os exemplos musicais postados.
Abraço
Prezado Mestre Olney, como negar a qualidade dos saborosos textos e a tonelagem de conhecimento de Mr. Cordeiro? Impossível.
Prezado Mr. Tandeta, bom saber que tudo correu bem. Caso queira expor suas aventuras além-mar aqui no Jazzseen, você sabe, a casa é sua.
Sim, quero sim o álbum, sobretudo se vier autografado.
Quanto ao Rio, estarei por aí agora em junho. Quem sabe eu e Mestre Olney não possamos ouvi-lo pessoalmente?
Grande abraço, JL.
Prezados Capitão Lester, Tandeta e Figbatera (já dá prá pensar em uma jam e se chamarem o Salsa vai ficar melhor ainda),
Estou me sentindo o próprio Roberto Carlos (grande capixaba!) na fase "eu quero ter um milhão de amigos" e graças ao jazzseen e ao jazzzbackyard creio que vou atingir esse número rapidinho!
E, Mr. Lester, mais uma vez obrigado pelas palavras gentis.
Abração!
Mr. Lester,
só osso dizer:"OH SORTE!"(coyright by Wilson Das Neves).
E esta prometido : assim que a caixa de CDs chegar pra mim o exemplar do Sr. partira celere pelo correio devidamente autografado pelo Victor,pelo Sergio Barrozo e por mim.
Uma dica: é simplesmente sensacional a radio online Jazz At Lincoln que e´comandada por Winton Marsalis ,tambem o cabeça de todo o projeto Jazz At LC. Os programas vem listados como um menu e duram em media uma hora. Na maior parte dos casos são gravações ao vivo feitas na sala especialmente construida para abrigar os concertos da big band liderada por Marsalis. Alguns dos concertos são tematicos:bebop,Ellington,Mingus,Monk etc com intervenções bastante informativas feitas pelo proprio Marsalis. Nota mil.
Abraço
Desculpem a omissão: A radio é Jazz At Lincoln Center e esta em :
http://www.jalc.org/jazzcast/archive.asp
Tô na fila tb(rs,rs,rs).JL, confere a cx q tem uma "short message" pra ti.JALC tem o codinome de Lester´s home em NY.Chiii..esse Barrozo e com (z), favor retificar.Abraço
Bem, creio que a semana começa bem. Afinal, quem dispõe de tantos amigos educados, inteligentes, bem informados e capazes de distinguir a boa música no momento em que é feita?
O Jazzseen só tem a agradecer a todos a atenção, o carinho e as informações que tem recebido ao longo dessas quase 1.000 postagens. Sei que Mr. Edù vai aprontar alguma com esse número.
Boa noite, JL.
Gostei do Auld, vou tentar conseguir os álbuns que você falou Lester. Valeu!
Vamos por partes: mr. Lester, explorava ainda o Bob Enevoldsen, cujo user lá do soulseek mandou-me o álbum com capa, contracapa, encartes, rótulos e tudo (q acho) q tenho direito e vi (ouvi primeiro) q participava do disco, excelente, como sempre, um certo Marty Paich, oras num órgão, oras numa acordeonzinha muito bacana. Pesquisando sobre este músico, no particular, encontrei um álbum q recomendo geral! Chama-se Marty Paich "The Picasso of Big-Band Jazz" 1957. Estou seriamente inclinado a postá-lo, inclusive.
É redundante agradecer-lhe sobre a dica e o desencadeamento dela? Não precisa responder, agradeço mesmo assim.
Esta a parte em q ainda estou: Bob Enevoldsen e nos agradecimentos. Resta ler e emburacar sobre as novas postagens.
Abraços!
Prezado Sérgio, você está com pressa ou é impressão minha?
Obrigado pela visita e pela pesquisa.
Sim: Paich merece toda nossa atenção: aguardo sua postagem sobre ele, especialmente se falar sobre seu desempenho como pianista e arranjador. Dica? Seu álbum com Art Peppper, o primeiro de uma série que o saxofonista gravou com Paich após sair da prisão.
Grande abraço, JL.
Adorei a faixa que toca na resenha de baixo Lester, arranja pra mim? Bju!
Ah, queria também o disco do Victor Biglione, pode ser? Bejuuuuuuuuuu!
Não, mr. Lester, sem pressa, ao contrário. Leio para me aprofundar no artista e nos que vem com ele, tutti bona gente tbm. E só depois passo pro post seguinte. Então, muita calma nessa hora.
Se não for pedir muito........ Marília, frequenta meu bloguito tbm, ele é pobre mas é limpinho...
Rs! Não resisti, é q a gente fica escrevendo de cara pra fotinho dela, favê o Q?...
Mas não era bem o queria dizer antes do gracejo tomar-me de assalto. O importante é: Lester, se não for pedir muito, contamine o sônico com o seu saber, dizendo mais do q meias palavras sobre a menina Nikki Yanofsky, please. E - aqui fala o apressado: sacanagi se me vier com "para bom entendedor..." o moço pobre dos clichês aqui, c sabe, é este q vos diz.
Abraços.
Fico feliz em saber que o blog continua a todo vapor. E arranje um tempo para vir a Itaipava, estamos com saudade.
JL,thanks.
Ei, Marília, aposto que vc vai ganhar!
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