Dizem que todos têm um pai, mas certamente poucos têm um pai exportador de café que forneça ao filho os recursos necessários para que perambule por New York, Paris e Rio de Janeiro, dos vinte aos vinte e nove anos, ouvindo música e comprando LPs. Esse era o caso do baiano Jorge Cravo, um apaixonado por jazz que teve a oportunidade de assistir ao vivo a apresentação de artistas como Billie Holiday, Louis Armstrong, Nat King Cole, Stan Kenton, Sarah Vaughan, Duke Ellington e muitos outros, quase sempre mantendo algum tipo de contato direto com eles. No livro O caçador das bolachas perdidas, Rio de Janeiro: Record, 2002, Cravinho relata suas peripécias ao redor do mundo, com passagens memoráveis por cidades maravilhosas, como o incidente em Paris, quando telefonou para Sarah Vaughan às 9 da manhã e teve como resposta da cantora um gentil 'fuck you'. Em suas andanças, Cravinho reuniu uma das mais importantes coleções de LPs de jazz dos anos 1940 e 1950, acervo lamentavelmente desfeito pelo proprietário que, anos depois, arrependeu-se profundamente de vender suas queridas bolachas pretas. São 255 páginas de um texto leve, rico em detalhes curiosos, emocionantes e engraçados, sempre revestidos por sua compulsiva paixão pelos discos, espécie de vício que lhe persegue por toda a vida. Sem dúvida, O caçador das bolachas perdidas é um desses livros essenciais para aqueles que, como eu, somos completamente dependentes desse opiáceo chamado jazz. Para quem deseja comprar o livro e vive no sertão capixaba, onde livrarias, árvores e calçadas estão sendo exterminadas numa velocidade assustadora, recomendo o site Estante Virtual, onde há exemplares a partir de R$18,00, mais frete. Novo, nas estranhas cidades que ainda possuem livrarias, sai por R$35,00. Para os amigos, e dedicada a Cravinho, deixo a faixa Embraceable You , com Nat King Cole (p, v), Oscar Moore (g) e Red Callender (b). Em New York, Cravinho esteve a poucos centímetros de Billie Holiday, sentada no balcão de um bar, calada, curtindo sua solidão. Notando a situação, ele se afasta sem interrompê-la.
7 comentários:
Deliciosa faixa com Nat King Cole...
E na cidade onde funciona o "Me empresta?", pode ser?
Mr. John Lester,
Estou ávido para desfrutar das aventuras do célebre Cravinho pelo caudaloso universo do jazz. Enquanto isso, deleito-me com as desventuras do Dorian Gray do jazz (no caso, o espelho era ele próprio), o glorioso Chet Baker, na biografia No fundo de um sonho.
Valeu!
Prezado amigo, sempre bom tê-lo conosco. Estamos aqui, ouvindo Clifford Brown e Oliver Nelson, enquanto a garrafa de La Grola IGT 2005 se esvazia impune.
Trata-se de um italiano tinto meia guarda, produzido por Allegrini a partir das cepas 70% Corvina Veronse 15% Rondinella 10% Syrah 5% Sangiovese 13,5º. Como todo bom italiano, é envelhecido em sarcásticos 16 meses em garrafa, não em carvalho francês. Portanto, não espere aquele sabor típico do cabernet californiano ou chileno. Afinal, estamos em Vila Velha.
Quando vier , venha. Grande abraço, JL.
Mr. Lester,
Ontem a "farra" foi aqui, ao lado do meu compadre Celijon e do amigo Victor Castro, um fantástico violonista português está morando em São Luís e que deu uma palhinha (melhor dizer uma palhona) aqui em casa.
Ficamos até uma da manhã na excelsa companhia de Baden Powell, Wes Montgomery, Jim Hall e outros mestres das cordas.
Algumas boas garrafas de vinho foram abatidas nessa viagem etílico-musical e o aquecimento para Ouro Preto continua.
Abração!
Jazz, vinho e livro, o que seríamos sem eles? Espero que aprecie o de Baker, para mim a melhor biografia já editada sobre ele. Temos até resenha antiga a respeito, aqui no Jazzseen.
Grande abraço e, espero, até Ouro Preto.
JL
Caro Mr. Lester
O Sr. Jorge Cravo seria conhecido se não tivesse nascido em berço de ouro?
Agora, uma pergunta cretina: você já degustou algum vinho produzido no R. G. do Sul ou acha que a qualidade não é merecedora?
Abraços.
Ilibado Mr. Müller, há quanto tempo! Que bom que apareceu.
O próprio Cravinho, no livro em comento, se define como "um filhinho de papai do Norte (sic) do Brasil, esnobado pelos filhões de papai do Sul". E, ao longo do texto, demonstra ser uma pessoa sinceramente apaixonada pelo jazz e pelo cinema. Além disso, escreve bem, com simplicidade e humor, suas aventuras por cidades maravilhosas, sem medo de expor os ridículos que fazem parte da existência de todos nós, pobres, remediados e ricos.
Quanto aos vinhos brasileiros, sejam do Vale do São Francisco, sejam do Sul, ainda os considero muito caros para uma investida mais séria - é bom lembrar que não sou filhinho de papai, nem do Norte nem do Sul. Da mesma forma, são caros os vinhos franceses (pela tradição) e os Australianos (pelo frete).
Apenas para raciocinar: acredito que com, digamos, R$100,00, você compra vinhos chilenos ou argentinos superiores a vinhos brasileiros ou franceses. Isto não quer dizer que os vinhos franceses são ruins, significa apenas que você gastará mais de R$100,00 para atingir qualidade próxima ao do chileno ou argentino de R$100,00.
Em resumo: eu não tenho coragem de pagar R$500,00 num vinho brasileiro. Na verdade, nem penso nessa possibilidade quando lembro de um Alma Viva ou similares.
Grande abraço, JL.
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