28/10/2006

Impressões da primeira noite do Tim Festival: Mr. Hargrove

Imagino eu que todo Chef gostaria de ter uma bela e bem abastecida cozinha. Se Roy Hargrove fosse um mestre-cuca, ele não teria do que reclamar: além do seu auxiliar imediato, o saxofonista Justin Jay Robinson, ainda conta com o apoio do trio formado por Gerald Clayton (piano), Tony Sanders (baixo acústico) e de Montez Coleman (bateria). A expectativa (algo tensa) que reinava entre os jazzófilos vitorianos referia-se ao prato que seria servido: se teríamos uma receita mais tradicional ou se o Chef iria se arriscar pelos campos da nouvelle cuisine jazzística, para a qual muita gente torce o nariz. A tensão foi defenestrada quando Hargrove apresentou como entrada um groove bem marcado de Hard bop. O que se seguiu foi uma seleção das "pegadas" que dominaram os anos sessenta: baladas com clima à moda de Evans servida com o sopro envolvente de Hargrove ao fluegelhorn; aquele balanço funky tão peculiar a Horace Silver que fez e ainda faz a cabeça de jazzófilos dos oito aos oitenta; serviu também um pouco de molho latino e até, incidentalmente, uma pitada de free jazz. O grupo, capitaneado por Hargrove, mostrou ao que veio: tocar jazz. Com todas as letras. O que não deveria ser surpreendente, por se tratar de um festival de jazz. Mas vamos ao que interessa: a performance do grupo. Hargrove é um músico que ainda valoriza o jazz como estilo. Ele mantém o seu sopro e fraseado voltados para o horizonte criado pelos grandes jazzistas e, melhor ainda, insufla um pouco de vida nisso que muitos consideram um cadáver ambulante. O jazz vive. E a platéia, predominatemente jovem, garante que ele viverá muito tempo ainda. Jay Robinson, por sua vez, é um saxofonista de primeira linha, com fraseado que reverencia os grandes bopers do jazz sem perder a sua autonomia criadora. Ele simplesmente tocou como pedia o clima do show: muito bem (apesar de, em alguns momentos, se afastar em demasia do microfone - fato que prejudicava a percepção clara de suas construções). O trio que cuidava da sessão rítmica foi um show a parte: Clayton imprimia o molho mais moderno (herança de Evans) na harmonização, enquanto Sanders mostrava vigor e muita precisão na condução de seu baixo. Mas, como todos jazzófilos sabem, uma sessão de jazz sempre nos reserva surpresas. A cada apresentação alguém se destaca, se eleva no meio do grupo e acaba se tornando o norte que guiará o resto do grupo. Nesta noite não foi a vez do band leader. Quem dominou o palco e o público foi o baterista nascido em St Louis, Montez Coleman. O homem estava possesso. Como bem salientou o jazzófilo Rogério Coimbra, parecia que Gene Krupa havia baixado e saravado no teatro da Ufes. Com baquetas ou vassourinhas, era Coleman quem animava e contagiava os músicos e a platéia. A performance de mr. Coleman, enfim, foi memorável. Aguardemos, para hoje, a performance de mr. Hancock.

Um comentário:

John Lester disse...

É triste dizer: o show de Herbie foi um dos mais chatos a que já assisti em minha vida. Lamentável. O de Hargrove deu de dez a zero.