
Imagino eu que todo
Chef gostaria de ter uma bela e bem abastecida cozinha. Se
Roy Hargrove fosse um mestre-cuca, ele não teria do que reclamar: além do seu auxiliar imediato, o saxofonista
Justin Jay Robinson, ainda conta com o apoio do trio formado por
Gerald Clayton (piano),
Tony Sanders (baixo acústico) e de
Montez Coleman (bateria). A expectativa (algo tensa) que reinava entre os jazzófilos vitorianos referia-se ao prato que seria servido: se teríamos uma receita mais tradicional ou se o
Chef iria se arriscar pelos campos da
nouvelle cuisine jazzística, para a qual muita gente torce o nariz. A tensão foi defenestrada quando
Hargrove apresentou como entrada um groove bem marcado de
Hard bop. O que se seguiu foi uma seleção das "pegadas" que dominaram os anos sessenta: baladas com clima à moda de
Evans servida com o sopro envolvente de
Hargrove ao
fluegelhorn; aquele balanço
funky tão peculiar a
Horace Silver que fez e ainda faz a cabeça de jazzófilos dos oito aos oitenta; serviu também um pouco de molho latino e até, incidentalmente, uma pitada de
free jazz. O grupo, capitaneado por
Hargrove, mostrou ao que veio: tocar jazz. Com todas as letras. O que não deveria ser surpreendente, por se tratar de um festival de jazz. Mas vamos ao que interessa: a performance do grupo.
Hargrove é um músico que ainda valoriza o jazz como estilo. Ele mantém o seu sopro e fraseado voltados para o horizonte criado pelos grandes jazzistas e, melhor ainda, insufla um pouco de vida nisso que muitos consideram um cadáver ambulante. O jazz vive. E a platéia, predominatemente jovem, garante que ele viverá muito tempo ainda.
Jay Robinson, por sua vez, é um saxofonista de primeira linha, com fraseado que reverencia os grandes bopers do jazz sem perder a sua autonomia criadora. Ele simplesmente tocou como pedia o clima do show: muito bem (apesar de, em alguns momentos, se afastar em demasia do microfone - fato que prejudicava a percepção clara de suas construções). O trio que cuidava da sessão rítmica foi um show a parte:
Clayton imprimia o molho mais moderno (herança de
Evans) na harmonização, enquanto
Sanders mostrava vigor e muita precisão na condução de seu baixo. Mas, como todos jazzófilos sabem, uma sessão de jazz sempre nos reserva surpresas. A cada apresentação alguém se destaca, se eleva no meio do grupo e acaba se tornando o norte que guiará o resto do grupo. Nesta noite não foi a vez do band leader. Quem dominou o palco e o público foi o baterista nascido em St Louis,
Montez Coleman. O homem estava possesso. Como bem salientou o jazzófilo
Rogério Coimbra, parecia que
Gene Krupa havia baixado e saravado no teatro da Ufes. Com baquetas ou vassourinhas, era
Coleman quem animava e contagiava os músicos e a platéia. A performance de
mr.
Coleman, enfim, foi memorável. Aguardemos, para hoje, a performance de mr.
Hancock.
Um comentário:
É triste dizer: o show de Herbie foi um dos mais chatos a que já assisti em minha vida. Lamentável. O de Hargrove deu de dez a zero.
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