07/01/2008

Chris

Mr. Lester resolveu partir em férias - dizem que estaria perambulando pelas ruas de Baton Rouge - e me entregou dificílima tarefa. Mas, vamos a ela. Chris Potter, nascido em Chicago em 1971, é considerado por muitos um menino prodígio. Mudando-se ainda criança para Columbia, aí passaria a infância com os pais, professores universitários. Começa na música tocando piano de ouvido e considerando o som do saxofone rude, incômodo e feio. Mas, depois de ouvir Take Five com Paul Desmond, muda de opinião e resolve tocar saxofone. Começou pelo alto, sofrendo forte influência de Johnny Hodges, o mais importante sax alto de Duke Ellington. Aos oito anos já tocava bem seu novo instrumento e participa de algumas sessões informais com jovens estudantes de música da Universidade de Columbia. Parte, então, para outros sopros, entre eles os saxofones tenor e soprano, a flauta e o clarone, bem como amplia suas referências, passando a ouvir Coleman Hawkins, Lester Young, Charlie Parker, Stan Getz, Ben Webster, Sonny Rollins, John Coltrane, Wayne Shorter, Joe Henderson, Ornette Coleman, Eric Dolphy e Dewey Redman. Nesse período Chris recebeu importante orientação dos professores do departamento de jazz da universidade de Columbia, entre eles Roger Pemberton. Bem mais velho, já com 12 anos, Chris recebe o prêmio de melhor saxofonista do prestigioso IAJE Young Talent de 1983, mesmo ano em que Terri Lyne Carrington (d), Charnett Moffett (b) e Harry Connick, Jr (p) são premiados em seus respectivos instrumentos. A essa altura, Chris já atuava profissionalmente e, em 1984, se apresentou no Aspen Music Festival, onde conheceu o baterista Myles Weinstein que, impressionado pelo desempenho do garoto, o convidou alguns anos depois para integrar o The Jazz Mentality, ainda hoje em atividade. Dois anos depois, Marian McPartland passa por Columbia e ouve Chris tocando. Impressionada, tenta convencer o pai de Chris a deixá-lo sair em turnê com alguma grande banda, como a de Woody Herman. O pai de Chris concorda, mas exige que o filho primeiro termine a escola secundária. Assim, dos 15 aos 17 anos, Chris perambula pela cidade e, nesse meio tempo, conclui o segundo grau com várias premiações, como um Presidencial Scholar pela sua excelência acadêmica e musical, uma bolsa de estudos do Hennessey Jazz Search, o prêmio de melhor saxofonista de escolas secundárias concedido pela Down Beat e uma bolsa de estudos, concedida por Zoot Sims, para estudar na prestigiada The New School for Social Research.

Mas não há dúvida de que o maior prêmio que Chris ganhou naquela época foi a oportunidade de tocar com Red Rodney no Columbia’s Main Street Jazz Festival de 1989. Os organizadores do festival conseguiram convencer Red a permitir que Chris participasse de dois números. Depois dos dois números, bastante impressionado, Red convidou Chris não apenas para tocar durante toda aquela noite como também em todas as suas apresentações no festival. Afinal, um menino prodígio deve ser capaz de reconhecer outro. Red começou sua carreira aos 15 anos e, aos 22, era o trompetista do quinteto de Charlie Parker, com quem tocou por três anos. E foi assim que Red disse a Chris para lhe telefonar quando chegasse em New York. Com 18 anos, Chris parte para New York e, ao ligar para Red, descobre que este estava precisando de um saxofonista para seu quinteto. O convite foi imediato. Além de trabalhar com Red, Chris freqüenta a The New School, onde conhece músicos como Brad Mehldau. Foi lá que, durante alguns exercícios com Kenny Werner, seu professor de composição, Chris começou fazendo algumas perguntas e, depois de tocarem juntos três músicas, Chris passou a dar algumas lições e dicas para Werner. Em 1990 Chris matricula-se na Manhattan School of Music, onde se formaria três anos mais tarde, fazendo contato com outros músicos brilhantes, entre eles o trompetista Ryan Kisor. Ainda em 1990, Chris faz sua primeira gravação, como membro do quinteto de Red Rodney. É também nesse ano que se apresenta pela primeira vez no Village Vanguard, com o mesmo quinteto. Na platéia estavam dois expectadores de tirar o fôlego de qualquer iniciante: Dizzy Gillespie e James Moody. Em 1991 Chris não grava, preparando-se para o importante Thelonious Monk International Jazz Saxophone Competition, obtendo o terceiro lugar, ao lado de Tim Warfield. O segundo colocado foi nosso amigo Eric Alexander, de quem já falamos aqui no Jazzseen, e, em primeiro, ninguém menos que Joshua Redman. Em 1992 Chris volta aos estúdios com Red, gravando também com seu antigo colega da Manhattan School of Music, Bill Warfield. Em 29 de dezembro desse ano, com apenas 21 anos, Chris grava seu primeiro álbum como líder para o selo alemão Criss Cross: Presenting Chris Potter, com Kevin Hays (p), John Swana (t), Christian McBride (b) e Lewis Nesh (d).

Em 1993 Chris é convidado por Marian McPartland a gravar na Concord, gravadora voltada para o mainstream jazz que, a princípio, fugia bastante da proposta musical de Chris, mais próxima ao post bop. Felizmente, a participação de Chris no álbum de McPartland chamou a atenção dos diretores da gravadora, que o contrataram, o que levou Chris a gravar excelentes álbuns como líder, álbuns estes que, até certo ponto, alteraram o perfil que tradicionalmente caracterizou esse selo de jazz. Nos anos seguintes, Chris gravaria dezenas de álbuns para diversos selos, entre eles Verve e Sunnyside. Desses diversos álbuns, vale destacar Unspoken, gravado em 1997 para a Concord, com John Scofield (g), Dave Holland (b) e Jack DeJohnette (d), onde Chris demonstra que era capaz de abrir seu horizonte musical (todas as faixas são de sua autoria) para além da sólida herança bebop que recebera de Red Rodney. Infelizmente, em 1988, Chris começa a sentir os sintomas da doença de Meniere, espécie de desordem auditiva que lhe retirou quase 100% da audição no ouvido esquerdo. Apesar dessa terrível moléstia, Chris foi, e tem sido até agora, capaz de adaptar seu toque às limitações impostas pela doença. É em 1998 que acompanha Jimmy Hall em importantes turnês pela Europa. Em 2000 ganha o Jazzpar Prize, da Dinamarca, um dos mais importantes prêmios do jazz contemporâneo. Como resultado, surge o álbum This Will Be: The Jazzpar Prize, gravado ao vivo em 2000 para o selo Storyville, onde Chris confirma que, além de sua habilidade como instrumentista, é também um competente compositor. Desde então Chris tem gravado álbuns de alto nível, agora também para a EmArcy. Com sua base no idioma do bebop, Chris tem feito experimentações com o funky, o pop (até Beatles, quem diria) e a fusion que, ao invés de nos confundir ou desiludir, são capazes de oferecer novas propostas e caminhos para aquilo que, ao menos para mim, é, hoje, o jazz. Para os amigos navegantes, fica a faixa Easy to Love, retirada do álbum Pure, gravado em 1994 para a Concord. Até a próxima!

10 comentários:

Anônimo disse...

chris é nocivo

Sandra Leite disse...

Roberto,

Adorei!

Você, o post e o blog!;)

Anônimo disse...

Potter está tocando cada vez mais, mesmo com apenas uma orelha.

Anônimo disse...

ei, beto, por onde lester? nórlins?
valeu.

Anônimo disse...

Apesar do infortúnio, Chris Potter continua excelente músico, para nosso prazer. Muito bom !

Anônimo disse...

Caraca!
Não tem ninguém lendo o post que está grande demais. A galera está comentndo sem ler, quer apostar?
Tá parecendo Edú!
Eu li tudo.

W.

Anônimo disse...

Ei sempre leio integralmente as resenhas Jazzseen. E, confesso, nunca me arrependi.

Heide Wittgensz disse...

Essa saxophonist é muita bom!

Anônimo disse...

Como sou da turma que adora ler, não só leio como releio os posts do Jazzseen, sempre muito bem escritos e com informações interessantes sobre o JAZZ e afins e sempre com fundo musical de 1ª! Lamento que alguém considere as resenhas longas demais, e espero que continuem com o mesmo padrão, ou seja, textos bem escritos e com substância.

JoFlavio disse...

Não entendo a implicância dos “jazzófilos” com o grupo Steely Dan (Donald Fagen & Walter Becker). Até Miles Davis chegou a dizer que Fagen & Becker estavam muito à frente de qualquer outro grupo de pop/rock. Potter por várias vezes não só gravou como fez shows ao vivo com o Steely Dan, a quem considera uma grande escola de jazz contemporâneo. No entanto, outra vez vejo a biografia de Potter sem qualquer menção ao trabalho com o Steely Dan, como se fosse uma coisa menor. Para quem quiser conferir, basta passar a limpo o DVD “Two Against Nature”, Steely Dan, onde Potter aparece em grande estilo, inclusive com direito a solos.