16/09/2010

As coroas do Penguin - Amalgam

Aliás, sempre que penso em free jazz, penso num jogo de free futebol, com goleiros pulando sobre bandeirinhas, centro-avantes correndo com a bola na mão tentando marcar um gol contra, torcedores jogando os zagueiros para o alto, flanelinhas lustrando as balizas por cinco real e coisa e tal. Já no avant-garde jazz, tudo isso faz parte de um 'plano de jogo', tornando a coisa um pouco menos pior. Mas passemos ao tema da resenha: ao longo de suas mais de 1.600 páginas, com mais de 14.000 álbuns elencados, Richard Cook e Brian Morton, autores do já clássico The Penguin Guide to Jazz Recordings, concedem um número muito reduzido de 'coroas', marcas que sinalizam álbuns considerados verdadeiros marcos históricos do jazz. São apenas 67 coroas ao longo da oitava edição do guia. Confesso aos amigos que tive certa preguiça de efetuar uma nova contagem para a nona edição, mas posso adiantar ao amigo leitor que ao menos uma nova coroa foi concedida: o álbum agraciado foi The Third Quartet, do guitarrista John Abercrombie, lançado pela ECM em 2006. Mas, retornando à oitava edição, sempre causou-me espécie o fato de que a primeira 'coroa' concedida pela dupla era para o álbum 70, do trompetista sueco Jan Allan e, a segunda 'coroa' concedida era para o álbum Prayer For Peace, do conjunto inglês Amalgam. Ou seja, dois grandes desconhecidos eram agraciados com imensa honraria, ao passo que músicos e conjuntos como Muhal Richard Abrams, Pepper Adams, Cannonball Adderley, Air, Toshiko Akiyoshi, Manny Albam, Joe Albany, e Rashid Ali não tiveram nenhum de seus álbuns coroados. Note que estamos seguindo a ordem alfabética do guia e, sinceramente, creio que álbuns como Rejoicing with the Light ou Something Else mereceriam as tais 'coroas'. Mas, fazer o que? Ingleses são ingleses.

Quanto ao primeiro álbum coroado da nona edição, The Third Quartet, sinto informar aos amigos que não manifestarei nenhuma opinião, primeiro porque não o possuo, segundo porque de John Abercrombie basta-me o aclamado Timeless, álbum gravado em 1974 e lançado pela ECM. Creio tratar-se de um álbum para músicos profissionais porque, aos meus ouvidos amadores, não disse quase nada. Ok, John sabe dedilhar o violão mas, e daí? Onde está o swing? Onde está a emoção? Eu não sei.  Por mim, o jazz passaria muito bem sem ele.

Quanto ao segundo álbum coroado, 70, de Jan Allan, instrumentista e físico de partículas que trocou o piano pelo trompete, também sinto informar que não o possuo. Mas, mediante escabrosas pesquisas pela internet, encontrei algumas coisas do rapaz que me pareceram dignas de nota, o que me levou a encomendar - via Amazon - o tal álbum coroado.

Finalmente, quanto ao terceiro álbum coroado pela nona edição do Penguin, Prayer For Peace, trata-se de um interessante trabalho sobre aquilo que hoje os entendidos chamam de 'free improvisation'. Haverá aqueles que dirão 'isso não é jazz!' e eu responderei 'concordo'. Mas concordo em parte, afinal Ornette Coleman, Cecil Taylor e Albert Ayler estão presentes em todos os guias de jazz que conheço e, queiramos ou não, o Free Jazz é, não há como negar, um estilo consagrado do jazz. Aliás, estilo visitado por mestres como Steve Lacy, John Coltrane, Charles Mingus, entre outros instrumentistas que dominavam seus instrumentos, ao contrário da grande maioria de farsantes que produziram e produzem free jazz. Em verdade, o Amalgam poderia facilmente ser incluído naquele nicho denominado Avant-garde Jazz, sobretudo porque verificamos certa 'estrutura' na confecção dos temas e certas 'regras' para a livre improvisação, distanciando-se assim do absurdo caos que caracteriza o free jazz.

O Amalgam é mais um dos tantos projetos do saxofonista inglês Trevor Watts, nascido em 1939. Na década de 1950, durante o serviço militar, passou uma temporada na Alemanha, onde conheceu o trombonista Paul Rutherford e o baterista John Stevens, com os quais trabalhou. Na década seguinte, ajuda a fundar a New Jazz Orchestra, combo que, apesar do nome, recebe de bom grado instrumentistas do rock e do blues. No mesmo período, forma o Spontaneous Music Ensemble, com Rutherford e Stevens. Sempre disposto a vasculhar o ambiente da livre improvisação, Watts forma, ainda na década de 1960, o Amalgam, com o contrabaixista Barry Guy, sem perder o contato com o Spontaneous e integrando outras formações, entre elas a London Jazz Composers Orchestra e o grupo de jazz-rock Away.

Após dedicar um longo período ao avant-garde jazz, Watts volta-se para o estilo fusion, atribuindo importância sistemática a world music, sobretudo em seus trabalhos com o Moiré Music, projeto que reúne diversas formações instrumentais distintas em concepções musicais paralelas. Para os amigos, a faixa Tales of Sadness , retirada do álbum Prayer for Peace, com Trevor Watts (as), Barry Guy (b) e John Stevens (d). 

9 comentários:

Vagner Pitta disse...

Que isso, seu Lester!!!? Quase 15 minutos da mais ensurdecedora cacofonia ja presenciada na história do Jazzseen!!!


Éh...eu acho que a reforma do recinto lhe deixou um tanto atônito. Em nossas cabeças caíram pedriscos de concreto. Já o senhor parece ter aspirado muito pó de cimento. rsrs


Mas, na real, o free aí parece mesmo ter merecido uma das coroas.


Abraços!

thiago disse...

sinistro

PREDADOR.- disse...

Falar o que? Lester definitivamente endoidou.

figbatera disse...

Eu não gostei...

John Lester disse...

Prezados amigos, obrigado pelos comentários.

Em verdade, Mr. Pitta, já houve momentos de similar análise do free por estas bandas, vide o link Free Jazz na seção "Pauta de hoje" na coluna do blog.

Grande abraço, JL.

Érico Cordeiro disse...

Confesso que não ouvi :-)

John Lester disse...

Prezado Mr. Cordeiro, creio que o álbum vale ao menos uma audição. Nem que seja por curiosidade. Afinal, a coroa inglesa está aí há séculos.

Grande abraço, JL.

Sergio disse...

Pois é, seu mr. Lester, eu passo longe de Ornette Coleman, Albert Ayler e outros nomes que, inclusive, ouvi e li pela primeira vez aqui mesmo. Em minha nada santa ignorância sobre jazz, no geral, há 3 ou 4 anos, acreditava que o gênero tinha ‘evoluido’ para essa modernidade caótica do free jazz. Graças aos deuses do ritmo eu estava redondamente enganado. Mas blog de jazz bom fala sobre o jazz em todas as suas formas de manifestação. Negar a existência e permanência do free jazz é uma tremenda bola fora. Ao menos para os que estão interessados em aprender sempre. Até para saberem o que não gostam. Fora isso a caricatura textual que desenhastes na associação do free com o futebol é uma pequena obra prima do humor. Gosto muito do teu texto, seu mister.

Parabéns!

Roberto Scardua disse...

Concordo com o serjão, esse blog é show de bola rs!